terça-feira, 23 de setembro de 2014

COMO OZ CHEGOU A SER OZ?


Reafirmo o que disse em outros textos dentre as artes o cinema é o meu melhor remédio, minha maior influência e minha melhor inspiração. Ontem após um dia nebuloso resolvi ver o mundo se tornar colorido através das lentes do Mágico de Oz (1939). Percebi o quanto que os personagens do filme serviram de estereótipos para mim, para as culturas de massa, para a nossa contemporaneidade, em especial a bipolaridade entre o que seria o bem e o mal. Me fez muito bem ver o pulsante cenário em Tecnicolor, com suas flores de plástico seu horizonte pintado, suas fumaças amarelas, sua cidade das esmeraldas reluzentes.


Aprecio filmes em que a história apresente boa longevidade e quanto a isso Oz cumpre bem o seu papel. Para mim é o equilíbrio entre infância, diversão e uma bela mensagem da universalidade do amor, do apego a terra natal e a família. Vendo o filme com meus olhos de adulta percebo que Judy Garland, empresta a Dorothy um olhar amoroso e cativante, que nos faz acreditar que realmente ela conseguirá voltar para casa. Minha cena preferida, talvez uma das melhores de todo o cinema é quando ela, já com os indefectíveis sapatos vermelhos segue obstinada o caminho de tijolos amarelos em busca de seus objetivos.



Não me incomoda a inspiração teatral do filme, me admiro como uma técnica nova na época como o Tecnicolor foi tão bem empregada. É tudo absurdamente bonito. A bondade de Dorothy em ajudar os que encontram em seu caminho (Espantalho, Homem de Lata e o Leão) é universal e a ideia que é preciso acreditar em si mesmo não envelhece. Considero um dos melhores filmes já feito, provando que um filme infantil não precisa ser necessariamente tolo para divertir. A bela mensagem e as excelentes interpretações ainda terão denso significado por muito tempo, tanto para a história do cinema, quanto para expectadores de todas as idades.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

AS PERSONAGENS FEMININAS MAIS TRANSGRESSORAS DO TEATRO


            Acredito que a rebeldia tem um conteúdo dramático fundamental porque possibilita que um personagem supere seus limites e lute contra forças superiores estabelecidas. O destino, o poder, as normas do seu tempo, a própria morte. Selecionei quatro personagens que considero símbolos da contestação.


Antígona (Sófocles, 442 a.C.)- encarna o mito da rebeldia da pólis grega. Para ela não há escolha possível não há escolha possível: sua ação (sepultar o corpo do irmão contra a ordem do rei) é justa e necessária. Não admite submeter a sua ética a leis injustas, resta a ela se rebelar em sacrifício.


Julieta (Shakespeare, 1597)- é capaz das maiores transgressões pela paixão. Contraria os pais e recusa-se a casar com seu primo Teobaldo. Apesar da guerra ente as duas famílias une-se a Romeu em segredo. Mesmo com o fim trágico não deixou de viver sua paixão.



Santa Joana dos Matadouros (Bertolt Brecht, 1932)- Joana é uma líder proletária de uma revolta de trabalhadores dos matadouros, mas tem uma fragilidade no fundo acredita que todo homem é bom. Seduzida pelo patrão acredita que pode converte-lo, não consegue levar uma mensagem às outras fábricas. Por sua culpa a greve geral naufraga. Joana a partir de sua contradição, toma consciência do seu erro na hora da morte.



Geni (Toda Nudez Será Castigada, Nelson Rodrigues, 1965)- traz em si os dois arquétipos da mulher rodriguiana: a santa e a prostituta. Sua rebeldia está na síntese destes opostos. Geni é a prostituta que se apaixona por Herculano, mas não aceita ser amante dele  exigindo casamento.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

PARIS-MANHATTAN: CATIVANTE FILME DO CINEMA FRANCÊS



 Vi Paris Manhattan (França-2013) de forma totalmente despretensiosa e reafirmo minha impressão de que a França se impõe com sua política cultural de ideias indo além de um pretenso valor comercial. A diferença com os EUA é que arte não é comércio no cinema francês, mesmo que seja muito difícil de se seguir essa matriz de produção. Paris Manhattan é um filme incompreendido por parte da crítica que não legitima seu verdadeiro valor.


O filme é uma obra cativante porque homenageia o cinema francês, Wood Allen, o grande cineasta estadunidense e exalta o papel do romance na vida das pessoas. Alice (Alice Taglioni) é uma farmacêutica que não tem sorte no amor e para curar suas carências é viciada nos filmes de Wood Allen, na verdade ela se sente como se recebesse conselhos do cineasta e esses conselhos são baseados em diálogos de filmes seus. Adorei a ideia de colocar a personagem como uma farmacêutica-filósofa que receita filmes de Allen para curar solidão, traumas e outros problemas de alguns clientes.



É um filme simples mais valoroso, que trata da solidão do amor. Os pais de Alice sofrem juntos e silenciosos a doença da mãe. A irmã mais nova vive um estranho casamento. O romance de Alice e Vítor (Patrick Bruel) começa de forma tumultuada e evolui de admiração para amizade e finalmente paixão que se consolida com a presença inesperada do próprio Wood Allen. A cineasta estreante Sophie Lellouche produziu um filme simples mais cativante e o segredo pode ser a sinceridade com que trata seus personagens. Belo filme que transcede a produção meramente mercadológica.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

OS MELHORES SAMBAS DE NOEL ROSA


            O samba é a expressão mais autêntica da música brasileira, minha primeira lembrança musical são os sambas da década de 1930 que meu pai cantava. Selecionei quatro dos mais especiais do Noel Rosa (1910-1937), são sambas híbridos que misturam refrão de marchinhas carnavalescas e ginga do samba.


Com que roupa (1930) na interpretação do próprio Noel- samba sincopado, com ritmo que lembra exatamente o modo de perguntar com que roupa? Foi o primeiro sucesso de Noel, dizem que a origem do samba foi o fato de sua mãe ter escondido suas roupas quando ele ia para a boemia. Gosto de sua interpretação porque parece mais longa, além de dá a impressão que o próprio Noel está me repassando um recado.



Até Amanhã (1932) na interpretação de João Petra de Barros- acho um samba triste dos mais belos que a despedida já inspirou. Tanto a letra quanto a melodia transmitem dor e vibração. Como o melhor da música a despedida pode também ser alegre e contagiante afinal, o abandono é provisório “até amanhã se Deus quiser”...


Fita Amarela (1932) na interpretação de Mário Reis- Noel queria dizer que há alegria no samba e alegria na morte desde que ambos se integrassem na cerimonia fúnebre. Gosto da ideia que a morte poderia ser celebrada nos dias de carnaval como qualquer outro acontecimento cotidiano.



Palpite Infeliz (1935) na interpretação de Aracy de Almeida- segundo os historiadores Noel usou dessa música para desqualificar seu colega Wilson Batista que ousou falar mal da Vila Isabel. O que mais gosto na canção é a sua atriz entoativa vinculada a fala, além da ideia que seu destinatário foi reduzido a zero.

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

VIVENDO NO LIMITE: A ERA DOS EXTREMOS DE ERIC HOBSBAWM


            
A Era dos Extremos é um livro seminal para compreensão do século XX e da nossa contemporaneidade, escrito pelo historiador Eric Hobsbawm. Segundo ele, o século XX começa em 1914 a exatos 100 anos, com a primeira Guerra Mundial e termina em 1991, com o fim da União da Soviética. O interessante é que esse breve século foi caracterizado por extremos. De um lado o povo alcançou um padrão de vida até então inimaginável. Paradoxalmente foi o período que aconteceram as maiores catástrofes da história.


            Na primeira etapa do livro Hobsbawm relata a “Catástrofe”, ocasionada por duas guerras mundiais, que ele classifica como um embate só a “Guerra dos 31 anos” (1914-1945). Nessa etapa os projetos nacionais de potenciais capitalistas europeias entraram em choque. A segunda parte começa com os vitoriosos da Segunda Guerra dividindo as áreas de influência do mundo. De um lado o bloco socialista, de outro uma nova versão do capitalismo inaugurando sua “Era de Ouro”, com rápida industrialização e grande melhora na qualidade de vida da população.



            A partir de 1973, muitas mudanças ocorreram: a revolução dos costumes iniciada em 1968; a derrota dos Estados Unidos no Vietnã; a revolução da tecnologia da informação; a queda da União Soviética e a ascensão da China socialista na economia de mercado. Tudo isso revela um novo momento, em que a velha ordem estava sendo questionada. A Era dos Extremos termina e dá lugar a uma nova Era, feita de incertezas, em que novos desafios estão postos, novas questões são debatidas, mas velhos conceitos ainda predominam.