segunda-feira, 18 de novembro de 2013

A HISTÓRIA DA LOUCURA DE MICHEL FOCAULT




Minha história com os livros sempre foi uma história de amor, lembro que quando estava na faculdade tinha uma banca com uma vendedora que expunha e vendia livros, aquilo para mim era o melhor lugar da Universidade e perco as contas de quantas vezes me ausentei das aulas para ficar naquele espaço e  conhecer as novidades técnicas e literárias. Numa dessas visitas lembro de uma colega falando que tinha em casa a História da Loucura de Michel Foucault, depois disso, trabalhei com Foucault durante o mestrado e em minha trajetória como professora, conheci vários textos, mas só li História da Loucura esse ano, dez anos após ter terminado a graduação.


Ler a obra é revolucionar nosso olhar sobre a loucura, e as relações entre razão e desrazão como paradigmas do pensamento ocidental. O livro dialoga com as mais diferentes áreas de conhecimento como história, filosofia, psicologia, medicina, psiquiatria, psicanálise, a literatura e as ciências humanas em geral. O interessante é que Michel Foucault é um crítico mordaz do cientificismo puro e do academicismo e nesse ponto, me encontro totalmente afinada com o seu pensamento. Além de ter sido militante político e defender o direito dos loucos, prisioneiros e homossexuais.


A obra nos permite pensar a questão da loucura sob um outro prisma, que abala as estruturas tradicionais do racionalismo moderno, aquele que se encontra sacralizado no pensamento ocidental como sendo a verdade absoluta. Ele revira nossas tradições, nossos modos de existência. Publicado em 1961 como tese de doutorado do autor o seu texto continua atual.


História da Loucura, realiza uma investigação das diferentes formas de percepção da loucura, no período compreendido entre o Renascimento e a Modernidade. Antes do século XVII a loucura tinha uma outra percepção social, após esse período foi introduzida a prática de exclusão como necessidade de ordenação do espaço público. O interessante é que ele mostra que a psiquiatria desde o seu nascimento sempre teve em crise, pelo menos no que está relacionado a cientificidade e a neutralidade.


O grande mérito da obra é nos permitir escapar da definição da loucura como doença mental, percebendo o processo de constituição desta como uma construção através de uma análise histórica sobre a medicalização e psiquiatrização da sociedade. Após História da Loucura é possível e real, a negação para o internamento e isolamento do paciente com doenças mentais. Além de nos fazer refletir  que tratamento damos para o diferente na nossa sociedade? 

domingo, 17 de novembro de 2013

A CONSTRUÇÃO SOCIAL DO AMOR ROMÂNTICO



            Ontem fui a um casamento e diante do simbolismo e da carga de emotividade da cerimonia me questionei quando construíram a ideia de amor romântico? O amor romântico é um dos maiores sistemas energéticos do pensamento coletivo na nossa cultura, acredito que chega mesmo a transcender a religião, espaço em que as pessoas procuram transcendência, plenitude e sentido para a vida.


            Como fenômeno massificado, o amor romântico é uma invenção do Ocidente, estamos tão acostumados a ele que imaginamos ser essa a única forma de amor, ou o amor verdadeiro. Nas culturas orientais, por exemplo na Índia, encontramos que os casais se amam com cordialidade, devoção e estabilidade que chegamos a desconhecer. Eles não impõem aos seus relacionamentos os mesmos ideais que impomos aos nossos, nem fazem exigências inimagináveis, nem alimentam as expectativas que temos.


            O ideal de amor romântico chegou a seu auge no século XIX, nas primeiras décadas do século XX, o sexo era inseparável do amor e do laço conjugal. O ideal romântico integra a sexualidade natural do homem com o amor e o casamento propondo intenções recíprocas e indissolúveis. Assim, esse amor romântico que chegou a nossa contemporaneidade é construído com base numa combinação de ideais crenças e expectativas. Influenciados por esses modelos de comportamento, de forma inconsciente, predeterminamos como deve ser o relacionamento com a outra pessoa, o que devemos fazer e o que vamos lucrar.


            No amor romântico não basta amar, é preciso está apaixonado, que é a sensação de êxtase que o nosso parceiro tem que constantemente nos alimentar com a emoção intensa que a paixão proporciona. O mundo ocidental nos dá a sensação de que estamos sempre com razão e daí achamos que o amor romântico é o certo, o único possível de nos proporcionar a tão sonhada felicidade.


            Levando em consideração o número de casamentos desfeitos e de relacionamentos amorosos fugazes, dá para intuir que o amor romântico não está dando muito certo, acredito que é preciso, a libertação de nossas presunções e expectativas inconscientes, porque daí será possível atingir um novo patamar nos relacionamentos e sobretudo, uma nova consciência de nós mesmos.
            

sábado, 16 de novembro de 2013

BAUDELAIRE CONTINUA ATUAL



Revendo o relevante texto As Flores do Mal de Charles Baudelaire, vejo o quanto este continua atual no mundo em que vivemos. Em tempos de Internet e redes sociais, o aspecto da formação da pessoa humana deixa a desejar. A tecnologia ameaça nos isolar das interações mais verdadeiras, a efemeridade da vida atua criando uma agonia em grande parte da população, as quais vivem na razão de submissão a vida, encontrando saídas no fictício cyber espaço e criando angústias das mais diversas naturezas.


Em As Flores do Mal Baudelaire, antecipa essa angústia que a modernidade traz para a vida do homem, percebemos nos poemas sua insatisfação em relação ao progresso da Modernidade, e a substituição do homem pela máquina, o que levava o homem moderno a pensar que estava perdendo a sua própria identidade. O homem moderno estava perdido em sua época, valendo-se de várias identidades para sobreviver.


Para Baudelaire, a modernidade é a reconstrução e a afobação da humanidade na grande metrópole de Paris. Nada para ele é mais moderno do que a vida nas grandes cidades. O que seria então essa modernidade para o poeta? Seria a ideia de conflito, pois, provoca angústia e perda de aceleração, e é aí que reside o centro de aceleração cotidiana da vida moderna.


Baudelaire não vivia nos salões nobres de Paris, mas na vida boêmia francesa, carregada de extravagancias e conflitos que marcou a existência de sua época. Contudo, é considerado um dos maiores pensadores franceses de todos os tempos. Pela sua ousadia, tornou-se modelo para o século XX, influenciando as poesias de cunho simbolista.


Para ele o principal motivo de angustia do homem, é a fragmentação que ele está se deparando por consequência da modernidade. Nosso poeta é tão atual que acreditava que o avanço do moderno no século XIX, tinha rompido o laço de confiança das relações intrapessoais, tudo ficou muito passageiro, artificial, os homens têm medo de se relacionarem com os outros, porque se sentem fragmentados diante das grandes cidades.


Com sua poesia ele mostrou as divergências que a Cidade Luz oitocentista  estava passando, com o belo e o feio, as diferentes classes sociais dividindo o mesmo lugar. Acredito que Baudelaire é pertinente a nossa contemporaneidade e as nossas angústias, uma vez que temos a facilidade de observarmos com facilidade todas as transformações que ocorrem ao nosso redor, não cultivamos mais nossas reflexões, mas, nossos bens materiais, não buscar mais o flâneur pelas cidades, mas pelas vitrines das lojas de grife, assim, percebemos que o nosso flâneur está invertido não queremos refletir, mas possuir.


Seja pela nossa ânsia de nos comunicarmos por meio da comunicação virtual, seja por nossa necessidade de consumir, a angústia moderna permanece, como podemos ver nesse trecho: Sou como o rei sombrio de um país chuvoso, Rico, mais incapaz, moço e, no entanto idoso, [...] Não sabem mais que traje erótico vestir Para fazer este esqueleto enfim sorrir / O sábio que ouro lhe fabrica desconhece
Como extirpar-lhe ao ser a parte que apodrece, [...] (BAUDELAIRE, 1985, p. 295).


Nesse trecho fica evidente a fragilidade do homem moderno que tem tudo, mas não tem nada, sendo jovem percebeu-se idoso porque não pode atuar, as máquinas tomaram o lugar dos trabalhos artesanais. O homem da modernidade é o da incerteza do vazio que o norteia, das aparências que cultiva. O homem contemporâneo, vive de valores efêmeros, fragmentação, angustia existencial, daí, reside a atualidade do pensamento de Baudelaire.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

A BOA LEITURA DE 1889 DE LAURENTINO GOMES




Gosto de tudo que está relacionado ao Brasil, quando estava na academia procurava entender o país sob o ponto de vista de estudiosos que usavam como ponto de partida o método científico, comecei apresentando trabalhos com base no clássico Casa Grande e Senzala e daí entender o Brasil foi um tema que nunca mais saiu de mim. Além disso sou fascinada por história, em especial a chamada micro história, aquela que é mais próxima do mundo da história que não é contada pelos vencedores. Deve ser por isso que gosto tanto do trabalho do jornalista Laurentino Gomes, que com esse livro 1889 encerra uma bem sucedida trilogia sobre a história do país, os outros textos são 1808 e 1822.


Quando estava no mestrado me questionava quem vai ler minha dissertação? Terá eficácia prática ou ficará apenas arquivada e empoeirada em alguma estante de uma biblioteca de uma Universidade? Acredito ser esse o fim da maioria das teses, principalmente no Brasil, não atingem o grande público, e Laurentino Gomes com o seu trabalho, vai na contramão desse ostracismo, possibilita o alcance dos acontecimentos sobre o viés da micro história, ao grande público, os fatos que ele narra na trilogia foram essenciais para a formação e consolidação do país que temos.


Acredito que por sua linguagem objetiva, mais próxima da realidade é que seus livros são sucesso de crítica e de público, o que mostra que existe um grande contingente de pessoas interessadas em nossa história, talvez não o fizessem porque as opções que tínhamos no mercado eram emolduradas pelo rigor e pedantismo academicista.


Sua linguagem flui, ler o seu texto é como ler uma revista, com o mérito de está discutindo a formação do país, elemento primordial para compreendermos a nossa contemporaneidade. 1889, não traz novidades, nem está dividido através do rigor cronológico, os capítulos, mostram os dois lados da revolução e são divididos, entre outros, da seguinte forma: O Marechal, O Professor, D. Pedro II, A Redentora. Para mim o mais interessante é o capítulo que traça o perfil do Imperador D. Pedro II, ele humaniza a figura do homem que viveu pelo Brasil e para o Brasil, o seu relato é tão fiel, que nada fica a dever a nenhum acadêmico.


Sua imparcialidade no texto é notável, mas, sabe analisar com precisão os acontecimentos que narra, quando diz que a República se impôs, mas pela fragilidade da Monarquia do que propriamente pelo vigor do movimento republicano ou pela agilidade do Marechal Deodoro. Acredito que o grande mérito do livro está em mostrar um fato que os acadêmicos já trouxeram e agora com o livro chega a conhecimento de um número muito maior de pessoas, a falta do elemento povo, na participação da proclamação da República e da queda do antigo regime, o povo de forma apática via os novos donos do poder dominar o país e a família real ser expulsa de sua pátria e ninguém se pronunciar. Uma mostra da nossa inoperância e desorganização enquanto movimento social político, na defesa dos nossos direitos.


Outro fato que eu gostava de dizer em conversas e discussões sobre o assunto, parafraseando Machado de Assis era que uma grande maioria, aqueles que estão sempre perto do poder, independente de quem esteja no mando, o que importa é sombra que o manto público proporciona, foram dormir ideologicamente monarquistas e acordaram ideologicamente republicanos desde sempre e para concluir fico com a frase do Capitão Feliciano do Espírito Santo (bisavô do ex presidente Fernando Henrique Cardoso) Vocês fizeram a República que não serviu para nada. Aqui agora, como antes continuam mandando os Caiado”.


Está de parabéns Laurentino, por descrever de forma tão bem elaborada esses acontecimentos que foram as raízes da formação e do caráter do povo brasileiro, leitura que transcende o prazeroso, já que tem o condão de aguçar a nossa percepção dos sistemas políticos do país.