O
século XIX é uma época importante porque considero a base da vida moderna tal
qual a conhecemos. Antecipando a
fotografia, vejo a inegável importância de Degas com a pintura da vida moderna.
Na década de 1860, novos temas passaram a integrar o inventário quase secular
da iconografia acadêmica. A mitologia burguesa se sobrepõe aos heróis do Olimpo
e do Sinai. A modernidade dos temas disseminou abordagens e modalidades inéditas
de olhares.
Degas
foi sem dúvida um dos artistas mais inovadores e originais do século XIX. O seu
olhar extraordinariamente agudo permitiu-lhe entrar no coração da vida
parisiense moderna- o café concerto, as corridas de cavalo, a vida nos
bastidores do teatro Ópera- com uma rapidez e uma liberdade de aproximação sem
precedentes.
A
dança tema característico de toda a sua produção apresenta jovens dançarinas
que modelam um corpo ainda juvenil, exibido bem além dos limites fixados pela
rigorosa moral burguesa da época. Ele via na dança- nos movimentos, na leveza e
na graça das dançarinas, uma sobrevivência do espírito da Grécia Antiga.
Para
mim a obra Em um Café (O Absinto) é o grande ícone da vida moderna. É uma cena
diante de um copo de absinto, é como se as duas figuras vivessem alheias ao que
o mundo estava vivendo com o frenesi da modernidade. A cena é ambientada no
Café de la Nouvelle-Athènes, da praça Pigalle, antigo ponto de encontro dos
grupos hostis ao imperador Napoleão III. Degas registra fielmente o lugar, das
mesinhas de mármore ao biombo que separava o terraço. Nesse registro fiel vejo
a antecipação da fotografia.
Degas
também foi escultor. O que chama atenção é uma bailarina esculpida com cera,
com peruca, gaze, sapatilha e bandana de seda entre os cabelos. A figura de 14
anos exibe a fisionomia animalesca, que, aos espectadores da época, sugeria uma
clara procedência social e promessas morais. Mostra inquietude com a
civilização moderna, reedição contemporânea das esculturas antigas, a pequena
bailarina representa representação única na escultura oitocentista.
Um
fato interessante é que Degas não teve alunos; talvez a sua originalidade fosse
tanta que outros artistas só conseguiram colher a sua herança aos poucos, mas
foi, porém o inspirador de vários deles e em geral sua inspiração sempre foi benéfica.