terça-feira, 10 de dezembro de 2013

O MAGNETISMO DO CINEMA



            O cinema foi um dos principais meios influenciadores da estética na modernidade. O olhar, a percepção e a recepção do homem moderno sofreram modificações. A importância do cinema é tão grande que mudou as experiências estéticas e a percepção sensorial das coletividades humanas nos grandes centros urbanos, como o Rio de Janeiro no Brasil.  A partir dos anos 1930 Hollywood nos Estados Unidos da América, passou a ser líder do setor e influenciar hábitos e costumes dos públicos de seus filmes.


            O mercado de distribuição cresceu rapidamente e as salas de cinema se multiplicaram por toda parte se tornando suntuosas, edificadas segundo o código modernista e ousado do Art decó. Ir ao cinema pelo menos uma vez por semana, vestido com a melhor roupa, tornou-se uma obrigação para manter a condição de moderno e ter reconhecimento social. Se o cinema era Hollywood, Hollywood era os seus astros e estrelas, que passaram a ter a vida esmiunçada e a filmografia divulgada por revistas especializadas. Ama-los era inevitável.


            Hollywood passou a criar clichês como o jeito de sentar, de dirigir o carro, de acender o cigarro, de olhar a moça do lado, de namorar, de tratar o garçom, de comer comida fast food, as roupas que veste, tudo passou a vim da tela. Após a exibição do filme Platinum blond, nos anos 1930, as mulheres do Rio de Janeiro, passaram a pintar o cabelo e a se tornar loiras. Nunca um sistema cultural teve tanto impacto e exerceu efeito tão profundo na mudança de comportamento do que Hollywood no seu apogeu.


            O cinema se tornou a vitrine por excelência da glamourização dos novos materiais e objetos utilitários, é a forma que se traduz pela ampla demanda atendida pela invasão crescente de plásticos, blue jeans, acrílicos, napas, entre outros. Materiais todos esses que tinham a imensa vantagem de ser produzidos em massa, ser baratos, resistentes, multicoloridos, e democratizar o acesso a um acervo de bens multiutilitários. As casas passaram a ser iguais e a decoração seguia o script determinado pelo cinema, com a convenção de duas poltronas, o sofá, a TV e o abajur ao lado com o vaso de antúrios para todas as salas, assim como a garagem e o quarto das crianças.


Acredito que quando as pessoas dizem que amam o cinema, há vários sentidos na frase, pois ele é afinal de contas uma máquina de simbolização e difusão do amor, à sua maneira. Essa forma simbólica transborda para a publicidade, as historias em quadrinhos, os livros de bolso, as canções populares, as fofocas, as fórmulas pelas quais a imprensa modela as informações sobre as pessoas e sobre as suas vidas, chegando aos olhos, ouvidos, mentes e corações de todos por toda parte.
           

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

FREUD E O INCONSCIENTE



 Freud é tão importante para moldar o nosso pensamento contemporâneo que todos falam dele, seja quando falamos que uma pessoa é controladora ou permissiva, ou quando especulamos sobre o significado dos nossos sonhos. Ele era um intelectual, um excêntrico, um cientista por excelência. Tornou-se tão popular quanto a velha máxima: Freud explica. 


A história tem uma relação complexa com Sigmund Freud, ele é valorizado e desvalorizado ao mesmo tempo. Ele é idealizado e denegrido. Em 1938, durante seu último ano de vida, sua mente continuava afiada, e descobriu novos fatos importantes sobre o inconsciente, a partir de suas conversas foi desenvolvida a psicanálise, uma nova ciência. E com a psicanálise Freud abriu as portas para o inconsciente transformando para sempre a forma como vemos a mente humana.


O fim do século XIX, marcou o Fim da Era Vitoriana um período de muitas restrições em que qualquer manifestação da sexualidade humana era considerada ultrajante. Mulheres respeitáveis só iam ao médico acompanhadas. Questões pessoais nunca eram discutidas na sociedade refinada. Terapeutas profissionais não existiam e as pessoas com problemas psicológicos não tinham a quem recorrer. Pacientes com problemas mentais eram colocados em asilos onde recebiam tratamento antiquado e até bárbaro.


Foi no meio disso, que em 1886, dr. Freud começou a tratar pacientes com uma abordagem simples, porém radical. ELE ESCUTOU. Os profissionais da época só prescreviam, porém não escutavam, eles eram as autoridades e era esperado que os pacientes obedecessem. Escutar a historia de vida de um paciente foi algo totalmente novo. O objetivo de Freud foi fazer com que seus pacientes falassem sobre tudo e qualquer coisa. Em seu consultório nenhum assunto era tabu.


Seu método era tão revolucionário que invés dele entrevistar seus pacientes cara a cara ele preferia que eles deitassem em um divã de costas para ele. Pois assim, eles se sentiriam mais confortáveis para revelar seus pensamentos mais profundos. Ele introduziu a ideia de inconsciente, pois acreditava que seria nesse espaço que enterraríamos conflitos como as nossas memórias mais dolorosas, ou pensamentos considerados inaceitáveis com os quais não queremos lidar. E isso, pode tornar a vida consciente mais difícil.


Para ele, o inconsciente seria o nosso EU real, a quem só conhecemos uma pequena parte. E o que realmente nos faz é o inconsciente, nós somos movidos por desejos sexuais por exemplo, que são barrados, mas que de alguma forma afeta o nosso comportamento. O interessante é que essa noção de mente inconsciente é algo que todos têm que lidar, aceitando ou não, ela não pode ser ignorada.


Ele descobriu em áreas reprimidas da mente fantasias de incesto, de assassinatos e ódios reprimidos e introduziu uma outra forma de ver a sexualidade, suas teorias foram consideradas moralmente ofensivas. Ele uniu ideias revolucionárias, sobre sonhos, inconscientes e sexualidade em uma nova e radical teoria sobre a mente. Uma nova ciência, a psicanálise.


Na opinião popular ele passou aos nossos dias como um guru místico, alguém que oferecia verdades aos seres humanos. Nos últimos anos Freud tornou-se dependente de Ana a filha mais jovem a quem passou a analisar, ela era enfermeira, secretária e filha. Se o objetivo da paternidade é criar e depois libertar isso não aconteceu nessa relação. Em cartas que os dois trocaram fica subentendido elementos de uma relação com traços de complexo de édipo, mas, Ana tornou-se uma mulher determinada, subverteu convenções sociais e tornou-se mundialmente reconhecida.


 Por tudo isso Freud explica: O homem é dono do que cala e escravo do que fala. Quando Pedro me fala sobre Paulo, sei mais de Pedro que de Paulo...
 Sigmund Freud (1856–1939).


domingo, 8 de dezembro de 2013

SOBRE A VIDA



A angustia de comprovar por meios racionais se existe vida após a morte acompanha a humanidade desde os seus primórdios. Imaginar que nos transformaremos em pó e que capacidades cognitivas adquiridas com tanto sacrifício se perderão irreversivelmente é a mais dolorosa das especulações existenciais, principalmente quando se vivencia uma doença grave como o câncer.


Tamanho interesse no destino posterior a morte, contrasta com a falta de curiosidade em saber de onde viemos. O que erámos antes do espermatozoide se encontrar no momento da concepção? Aceitamos com naturalidade o inexistir antes desse fato, mas temos dificuldade em admitir a volta a mesma condição do caminho.


Consideramos a vida uma dádiva da natureza, e nosso corpo uma entidade construída exclusivamente para nos trazer felicidade, atender aos nossos caprichos e nos proporcionar prazer. Essa visão egocêntrica mostra que somos seres exigentes, revoltados, queixosos, permanentemente insatisfeitos com os limites impostos pelo corpo e com as imperfeições inerentes à condição humana. Acordamos todas as manhas com a sensação de plenitude, e de funcionamento harmonioso do organismo que o desconforto físico mas insignificante, a mais banal contrariedade são suficientes para nos causar amargura e crises de irritação.


            As sensações de felicidade, ao contrário, geralmente são fugazes, o aparecimento de uma doença grave, eventualmente letal, tem o condão de desestruturar personalidades, causar desespero, destruir esperanças, inviabilizar qualquer alegria futura. Mas comigo não foi isso que aconteceu, vencida a revolta do primeiro choque e as aflições iniciais, associadas ao medo do desconhecido tenho conseguido reagir e descoberto prazeres insuspeitáveis na rotina diária. Laços afetivos que de outra forma não seriam identificados ou renovados,  serenidade para enfrentar os contratempos e busca de sabedoria para enfrentar aquilo que não pode ser mudado.


            Quando entendi que podia morrer pensei: não tem cabimento desperdiçar o resto da vida, viverei assim: se alguma coisa me desagrada procuro avaliar qual a importância que ela tem para o universo. Descobri que é possível ser feliz até quando estou triste, e quanto a isso, não tenho medo de me enredar em clichês ou na vala comum das vãs filosofias. 

sábado, 7 de dezembro de 2013

A ESTREITA RELAÇÃO ENTRE COMIDA E FELICIDADE





            A gastronomia nos ensinou que o ato de se alimentar é mais do que nutrir o corpo, foi a partir desse fundamento que começaram a ser cultivado os banquetes, para deleite dos prazeres o que iria além do simples ato de alimentação. Vetel possível inventor do creme Chantilly quis morrer por causa da gastronomia. O príncipe de Condé o encarregou de preparar uma festa para 3000 comensais em homenagem a Luiz XIV. Quando Vetel descobriu que os peixes para o almoço não chegariam a tempo preferiu a morte a servir um jantar ao rei sem peixes em uma época do ano que os cristãos não comiam carne.


            Carême escreveu sua explicação para o surgimento da grande cozinha relacionando que a apresentação dos pratos era tão importante quanto o seu sabor. O creme com Chantilly, por exemplo, foi criado a pedido de Napoleão Bonaparte para lembrar a honra e o sangue dos seus soldados sobre a neve russa. Na verdade quando a Europa começa a se tornar refinada nas maneiras e no desejo e  a cultivar o exotismo, lá pelo século XIX é que se começa o consumo de chocolates e cafés e a criação de locais próprios e rituais para isso.


            É desse período a ideia de como sentir da melhor forma possível o gosto dos alimentos e de considerar a gastronomia como o fim de todas as coisas humanas, dando ênfase aos sentidos, pois estes seriam tão importantes a ponto de nos diferenciar de estatuas de mármore. O gosto para os gastrônomos desse período, seria o mais importante dos sentidos, pois através dele tomamos conhecimento da realidade. Esse gosto seria excitado pelo apetite, pela fome e pela sede.


            Sendo assim, quando  inicia a capacidade cultural de se alimentar superando meramente a natural de satisfação das necessidades biológicas? Inicia-se com o surgimento da arte de se alimentar, embora nem todos estejam aptos de retirar do alimento todo o prazer que dele pode decorrer, porque a sensação de prazer só é conseguida se for incorporada a reflexão do espírito. Além da questão do tempo na degustação do prato, pois os que comem depressa não conseguem classificar por ordem de excelência as diversas substâncias submetidas ao seu exame.



            A sensação de felicidade à mesa se dá somente de forma refletida, e portanto, com a intervenção do tempo e da contemplação, que passamos do ato animal de nos alimentar para o ato propriamente humano de comer. Além de ser o homem o único ser capaz de domesticar seu alimento, de alterar a sua natureza, de modo a produzir novos sabores e se satisfazer com eles. Comer tem no homem uma função, sobretudo, civilizadora. E a gastronomia surge exatamente quando o homem busca satisfazer esses sabores complexos.


            O que é considerado então para que se tenha uma boa mesa? Comida ao menos passável; bom vinho; comensais agradáveis e tempo suficiente.  Eu particularmente acredito que o segredo da gastronomia é um só, o caminho para que o homem possa ser feliz comendo.