Fiz uma visita a casa de uma amiga que tem crianças e vi o quanto que ser
criança hoje é diferente de ser criança na minha época nos anos 1980. Os
interesses as conversas e perspicácia e a abordagem são totalmente diferentes,
ao que parece essas crianças de hoje são mais ativas do que os meus
contemporâneos e têm uma visão mais detalhada do mundo. Penso que essa nova
forma de pensar onde impera os elementos do mundo virtual foi construída para
que as crianças também fizessem parte dessa nova lógica do capital.
O homem não nasce homem, pois precisa da educação para se humanizar. Muitos são
os exemplos dados por antropólogos e psicólogos a respeito de crianças que, ao
crescerem longe do contato com seus semelhantes, permaneceram como se fossem
animais.
Na Alemanha, no século passado, foi encontrado um rapaz que
crescera absolutamente isolado de todos. Kaspar Hauser, como ficou conhecido,
permaneceu escondido por razões não esclarecidas. Como ninguém o ensinara a
falar, só se tornou propriamente humano quando sua educação teve início.
Nessa ocasião ficou constatado que possuía inteligência excepcional, até então
obscurecida pelo abandono a que fora relegado.
Esse caso extremo serve para ilustrar o processo comum
pelo qual cada criança recebe a tradição cultural, sempre mediada pelos outros homens, com os quais aprende os símbolos e
torna-se capaz de agir e compreender
a própria experiência. A linguagem simbólica e o trabalho constituem, assim, os
parâmetros mais importantes para distinguir o homem dos animais.
Não se pode dizer que o homem tem instintos como os dos
animais, pois a consciência que tem de si próprio o orienta, por exemplo, para
o controle da sexualidade e da agressividade, submetidas de início a normas e
sanções da coletividade e posteriormente assumidas pelo próprio indivíduo. O
homem foi "expulso do paraíso" a partir do momento em que deixou de
se instalar na natureza da mesma forma que os animais ou as coisas.
Assim, o comportamento humano passa a ser avaliado pela
ética, pela estética, pela religião ou pelo mito. Isso significa que os atos
referentes à vida humana são avaliados como bons ou maus, belos ou não,
pecaminosos ou abençoados por Deus, e assim por diante.
Uma coisa tenho por certa, o homem é o que a tradição cultural
quer que ele seja e também a constante tentativa de ruptura da tradição. Assim, a sociedade humana surge porque o
homem é um ser capaz de criar interdições,
isto é, proibições, normas que definem o que pode e o que não pode ser feito.
No entanto, o homem é também um ser capaz de transgressão. Transgredir é desobedecer. Não me refiro apenas à
desobediência comum, mas àquela que rejeita as fórmulas antigas e
ultrapassadas para instalar novas normas, mais adequadas às necessidades
humanas diante dos problemas colocados pelo existir. A capacidade inventiva
do homem tende a desalojá-lo do "já feito", em busca daquilo que
"ainda não é". Portanto, o
homem é um ser da ambiguidade em
constante busca de si mesmo.