Pierre
Verger (1902-1996) não gostava muito de dizer que sua fotografia era arte. Para
ele fotografar era parte de sua profissão a de etnólogo, que viajava pelo mundo
em busca de outras culturas. Mas o curioso de sua fotografia é que ela não pode
ser reduzida a dimensão etnológica ao passo que quase sempre foge a tentação de
estetizar seu objeto de estudo. Para mim ele está ao lado de grandes como Cartier
Bresson. Verger fotografava numa Rolleiflex,
o que dá uma aura meio mítica ao seu trabalho.
Suas
fotos têm um caráter de descoberta, um frescor que se traduz sempre por um
olhar interessado nas figuras humanas, sem deixar de obter uma composição
cuidada e bem elaborada. Elas têm uma instantaneidade de um flagrante e o apuro
de uma pintura, justamente os elementos fundamentais que formam um bom
fotógrafo. Refletem o olhar do viajante que não se basta do imediatismo,
chavões como alegria e mistura são reducionistas para definir seu mundo.
Pierre Eduard Leopold Verger nasceu
em Paris na mesma geração de fotógrafos que viu a cidade se entregar a arte e a
liberdade nos anos 1920 e depois a veria perde-la para as guerras e as
ideologias. Verger saiu da Franca antes disso e em 1932 esteve no Japão, Taiti,
na África, nos EUA, no México, sempre fotografado para publicações e museus. Só
nos anos 1940 descobriu a América Latina, passou pela Argentina, mas chegou ao
Brasil em 1946, depois de já ter visto o mundo todo. E foi a Bahia que fascinou
o seu olhar de fotojornalista e etnólogo. Na Bahia ele ficou extremamente
interessado na cultura negra, preservada em salvador desde a época da
escravidão, em especial pela religião do candomblé e pelas palavras do iourubá.
Ele foi sobretudo, um fotógrafo que
sabia ver beleza mesmo onde a simetria falhava e o sombrio se insinuava. Ele
mergulhou fundo na cultura do candomblé, que para ele não bastava chegar a ela
como observador acadêmico, mas como participante aceito. Seus livros sobre iourubá
e o fluxo de escravos entre África e Brasil se tornaram referência.
Verger descobriu com sua fotografia que o
candomblé no Brasil desempenhou o papel fundamental de reação a uma sociedade
que marginalizava o negro, servindo também para desviar sua amargura e seu ódio
para outros modos de cultura e expressão. Suas fotos denunciam o seu olhar, que
é de uma curiosidade daquela realidade social.