terça-feira, 17 de dezembro de 2013

O ANJO AZUL COM MARLENE DIETRICH



Não tenho dúvidas de que minha primeira imagem de cinema foi a de Marlene Dietrich sentada numa banqueta de meias e cartola num ambiente com um fundo esfumaçado, era assim que começava o verbete de cinema da Enciclópedia Britânica que tinha na estante da sala de minha casa, e um dos meus verbetes preferidos. Nunca mais esqueci o título do filme nem a nacionalidade alemã da atriz. Esses dias, resolvi ver o filme, que só tinha lido sobre, e tirar algumas conclusões.


O professor Imanuel Ratt, era um tirano para seus alunos, pois ia além da sala de aula, tornando-se fiscal da vida privada deste. O professor era sádico e tinha inigualável prazer em torturar seus alunos, o filme como um todo apresenta um forte teor psicossocial sadomasoquista. A vida desse professor um cinquentão rabugento e moralista sofre uma reviravolta ao investigar a vida de um aluno adentra a taverna O anjo azul. Ao se deparar com Lola, a dançarina ele cai de paixões, se dedicando a ela e dizendo e tornando-a sua esposa, o que escandaliza o diretor da escola que o demite e ele passa a seguir uma vida mambembe ao seu lado.


O professor foi concebido como o retrato acabado do filisteu alemão, autoritário e pedante. Nessa nova vida ele vivencia total decomposição moral, vivendo situações de humilhação e desespero, que culmina com o regresso a sua cidade natal onde é obrigado a atuar junto aqueles enquanto vê Lola entregar-se a outra das suas conquistas. O personagem, profundamente ferido, reage de forma alucinada e tenta matar Lola. Impedido de se vingar arrasta-se até à sua ex-sala de aula (cenário dos seus dias de grandeza) para morrer.


Feito em 1930, o som ainda era novidade no cinema, e o filme explora todos os tipos de sons, é a chamada trilha sonora diegética, usada para aproximar o filme da realidade. O filme tem um parentesco com o expressionismo alemão, que pode ser observado nos cenários do início, no uso das sombras e na história que mostra a degradação moral da nobreza intelectual alemã, personificado na figura do professor.


Mas ao que parece o principal motivo que fez o filme se tornar um dos mais cultuados filmes alemães de todos os tempos foi mesmo a figura enigmática de Marlene Dietrich apresentando ao mundo o seu talento, Marlene foi descoberta em um cabaré em Berlim e após fazer um teste de elenco foi escalada para o papel da cantora de cabaré Lola Lola, sua presença é tão magnética na tela que não fica difícil saber porque estava nascendo ali um novo mito.
  

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

NIILISMO E JEITINHO BRASILEIRO





            O niilismo é um movimento filosófico que nos revela a ausência de fundamentos, verdades, critérios absoluto e universal e nos convoca diante de nossa própria liberdade e responsabilidade. Nietzsche descreve o niilismo europeu como sendo o mais estranho de todos os hóspedes em uma passagem dos seus famosos textos Vontade de Poder, pensando nisso, fico pensando: Existe um niilismo especificamente brasileiro?


            Quando Nietzsche fala do niilismo europeu ele assume em sua afirmação o ponto de vista de um migrante, alguém que está junto, mas que é possível olhar de fora. Descrevendo o niilismo europeu como a experiência histórica de esvaziamento de categorias tais como: verdade, propósito, sentido, gerando então uma crise de desorientação e insegurança. Um dos sintomas dessa crise é a atitude de desprezo pelo corpo e os prazeres. Sob essa ótica, não há nada menos niilista do que a cultura brasileira, já que aqui impera o culto ao corpo e a sua saúde aparente. Mas na verdade o hedonismo parece ser uma tendência comum na maioria das sociedades contemporâneas.


            Afinal existirá alguma manifestação específica de niilismo brasileiro? Acho que temos algumas expressões como na separação entre o que é cultura de massa e cultura de elite; a primeira manipulada pela elite, a segunda inacessível as massas. Um outro ponto é a relação ambígua do brasileiro com a natureza, entre a fascinação deslumbrante e a fúria exploratória. E principalmente, a tendência brasileira de preferir não se comprometer, do tipo eu não to fazendo nada.


            A filosofia existencialista costuma distinguir entre a atitude autêntica da atitude inautêntica daquele que delega inconscientemente a responsabilidade de suas opções para os outros. O que os existencialistas não previram foi o chamado jeitinho brasileiro: a escolha intencional da não-escolha, da inautenticidade, do cinismo. Os brasileiros diferente dos europeus que ao que parecem só sabem jogar para ganhar muito ou pouco, assumem uma nova modalidade, mudar as regras do jogo, uma metáfora inusitada presente no carnaval, no futebol e sobretudo na nossa política.


            O Brasil é uma utopia não no sentido de lugar inatingível, mas de um fora de lugar, um lugar não determinado, mas cheio de possibilidades. Em questionários aplicados por estudiosos da área das ciências sociais encontrou-se como resultado que somos o país do jeitinho identificado em três dimensões: a criatividade, a corrupção e a quebra de normas sociais. Ao que parece nossa grande dificuldade está em conseguir separar as relações pessoais das relações que necessariamente exigem impessoalidade e isso não deixa de ser uma forma de niilismo. 

domingo, 15 de dezembro de 2013

GUIA DO RENASCIMENTO



            O Renascimento foi um movimento artístico que surgiu na Itália entre os século XV e XVI, e serve até hoje para definir a ideia que temos de arte. Só assumiu um paradigma muito mas amplo, em meados do século XIX quando o movimento começava a perder força como modelo estético, aumentou tanto que hoje, o seu significado chega a ser indeterminado. Não sabemos ao certo até que ponto foi construída a ideia de um “homem do renascimento” culto e esclarecido em oposição a um homem da idade média, carola e retrogrado.


            O que  sabemos é que modernidade mesmo aconteceu com a Reforma Protestante a partir de 1517. Em arte as transições são muito fluidas é impossível encontrar uma determinação fixa de quando começa um período e termina outro. Mas o que distingue o Renascimento Italiano enquanto movimento artístico inovador é a ideia de que a Antiguidade era uma cultura que deveria ser desenterrada após séculos de esquecimento, mas do que desenterrar o antigo, o Renascimento inventa a Idade Média.


            A primeira fase do Renascimento é formada por um grupo pequeno de artistas florentinos: Filippo Bruneleschi, Donatelo, Lorenzo, Lucca Della Robbia e Masaccio. Foram eles os primeiros que fizeram reviver uma arte que como a antiga, se inspirava diretamente na natureza. Artes na Florença da época eram as corporações de artesãos e comerciantes que governavam a cidade a cidade desde o século XIV. Essas corporações transmitiam seus conhecimentos de pai para filho, os conhecimentos não eram acadêmicos, tinham uma base empírica, e bebia na fonte da engenharia, na fundição de metais e na fabricação de cores.


            Em sua maioria não liam latim, mas dispunham de tratados de ótica e geometria, traduzidos e consultavam cientistas e matemáticos sempre que fosse possível. Eram leitores vorazes da nova literatura (Dante, Petrarca, Boccacio) e estudavam história. A cultura deles se definia em função dos projetos que estavam envolvidos, uma igreja, um monumento, um quadro. Não adianta procurar um traço, um estilo igual para todos: cada um era portador de uma maneira singular de conhecer e descrever o mundo e isso também era novidade.


            Os três grandes que marcaram a transição para o século XVI foram: Michelangelo, Leonardo e Rafael, já são plenamente artistas filósofos. Daí para a frente a arte estará mais interessada na expressão do pensamento em imagens do que no objetivo do mundo. Começa a se diferenciar da ciência experimental que nascera junto com ela.


            De tudo isso entendo que houve um Renascimento, ele começou em Florença, nos primeiros anos do século XV. Não construído por um “homem do Renascimento”, mas por poucos homens que provavelmente ainda eram medievais quanto ao resto. Não foi exatamente um renascer, mas uma invenção daquilo que conhecemos hoje por arte. 

sábado, 14 de dezembro de 2013

QUEIJO: UMA CONQUISTA DA HUMANIDADE



            O queijo é uma das grandes conquistas da humanidade. Não falo aqui de um queijo em particular, mas do queijo em sua fascinante multiplicidade recriada todos os dias, através das leiterias do mundo. O queijo nasceu como um meio simples alimento para concentrar e preservar a fartura na estação das ordenhas. Onde vivi a infância, no sertão nordestino brasileiro, queijo sempre foi sinônimo de fartura, de bons tempos. Queijo é algo que vai muito além da simples nutrição física, vejo como uma expressão intensa e concentrada dos pastos e dos animais, dos microrganismos e do tempo.


            O queijo é uma forma concentrada do leite, é um alimento mais durável, mais concentrado e mais saboroso. É feito através da coagulação do leite e pela remoção de boa parte de sua água. O ingrediente essencial de todos os queijos é o tempo. A técnica básica de coalhar o leite, drenar e salgar os coágulos passou pela Ásia Central e Oriente Médio, até chegar na Europa, onde foi introduzido as variações e os tipos tendo sempre o tempo como aliado. A arte de produção progrediu nos feudos e mosteiros da Idade Média.


            No fim da Idade Média, a corte francesa recebia encomendas das localidades de Brie, Roquefort, Comté, Maroilles e Gerome. Os queijos feitos perto de Parma na Itália e de Apenzol na Suíça eram conhecidos em toda a Europa e sempre gozaram de boa reputação. Na Inglaterra, o cheddar e stilton já eram famosos no século XVIII. O queijo desempenhava dois papeis: para os pobres, os tipos frescos ou pouco amadurecidos eram um alimento básico as vezes chamado de carne branca, ao passo que os ricos desfrutavam de vários queijos envelhecidos como parte de seus longos banquetes.


            A era de ouro dos queijos certamente, foi o sim século XIX e o início do século XX que já possuía linhas de escoamento da produção estruturadas e os produtos rurais eram levados para as cidades em sua melhor forma, além, da técnica de produção já está dominada. A produção, a qualidade  e o consumo viveram uma crise na Segunda Guerra Mundial, principalmente na Europa quando os campos de laticínios viraram campos de batalha. Os queijos padronizados e baratos alcançaram proeminência de lá para cá, a produção mundial é dominada por técnicas industrializadas. Nos Estados Unidos os processados, uma mistura de queijos maduros e frescos ligados por produtos industriais e atendem a sua função maior, servir de ingredientes aos alimentos de fast food. 


            Mas a base do alimento, sua beleza e qualidade, são os queijos feitos com arte, de forma tradicional, preferencia entre os apreciadores da boa mesa. Acredito que a beleza do alimento está em imaginar que por traz de cada queijo há um prado de verdes diferentes, sob céus distintos, com campinas perfumadas de aromas e  métodos que chegam a ser secretos transmitidos através dos séculos.