Todas as mulheres do mundo (1966) de
Domingos Oliveira com Leila Diniz e Paulo José é daqueles filmes que se
tornaram clássicos do cinema nacional, lição obrigatória para quem discute,
estuda, ou gosta de cinema. Comédia romântica de estética modernista,
claramente influenciada pela Nouvelle
Vague francesa, surge no contra fluxo temático e ideológico do cinema novo
sendo taxada de “alienada” pela facção engajada da crítica. O filme foi um
sucesso arrebatador de público, diferente de outros com estética menos
palatável de sua época, colocava o indivíduo e seus afetos mais íntimos no
centro das atenções.
O filme não entra em questões
sociopolíticas, o diretor investe no infatigável enredo romântico, apresenta
traços autobiográficos, à época separado da atriz Leila Diniz, Oliveira
oferece à ex-companheira o papel de Maria Alice, em uma trama que recria
ficcionalmente aspectos de sua recente (e mal-curada) relação. O enredo de Todas
as mulheres do mundo acompanha o reencontro fortuito entre dois jovens
amigos: Paulo, um conquistador “incorrigível” (Paulo José, alter ego de
Oliveira), e Edu (Flávio Migliaccio), um solteiro convicto. Inicia-se ali o
longo diálogo que pontua a trama entre o narrador Paulo e seus atentos
interlocutores.
A estrutura narrativa do filme é
composta a partir da colagem das memórias de Paulo em flashback, que
descreve o percurso acidentado de sua história de amor com Maria Alice (Leila
Diniz). Desde as artimanhas da conquista, passando por sucessivas brigas e
reconciliações, o romance tem um desfecho tão banal, quanto
surpreendente. Quando finalmente cede ao
matrimônio, Paulo assume um estado de indisfarçável excitação (evidenciado
pela eufórica na atuação de Paulo José), como se após cumprir este
ritual de passagem, o pesado ônus da liberdade juvenil lhe fosse tirado dos
ombros.
O filme culmina com o final feliz
dos contos de fada, fato irônico, porém condizente com a utopia amorosa que
Oliveira (ele próprio um confesso “Don Juan”), deseja urdir no universo
possível da ficção. Gostei de ver o filme porque apresenta questões que hoje
ainda reverberam como um equilíbrio delicado: de um lado, a franca consciência
masculina sobre as prementes reivindicações da mulher e de outro, a
resistência deliberada contra estes avanços, o que ainda limita até hoje questões de gênero dentro da relação tradicional entre homem e mulher.