Das muitas ideias sobre o que seja
cultura, quero me restringir a duas. A ideia de que seria uma espécie de
passaporte aristocrático: tanto a cultura como os pequenos gestos de
solidariedade de ampla divulgação podem servir para levar o nome, e os próprios
produtos culturais a se tornam mercadorias. Outro sentido é o de elemento que
permeia as relações humanas: na produção, no consumo e na distribuição dos
meios de viver, nas relações de poder e dominação, usufruto e prazer. São os
modos e ritos de nascer e reproduzir, do amor e da morte.
Se cultura é o que dá significado as
relações sociais, depois das polêmicas políticas em torno do acontecimento da
Copa do Mundo no Brasil, fiquei pensando, por que não celebramos o futebol,
injustiçado fenômeno cultural desdenhado pela chamada alta cultura? Afinal é um
espetáculo que paralisa cidades e até países inteiros. O teatro grego, que hoje
assistimos que respeitoso silêncio em sua formação era exibido entre vaias e
aplausos. Vejo algo em comum entre os dois, afinal ambos despertam paixões e
intermediam o prosaico humano e divino.
Não entendo bem as regras de
futebol, não assisto a jogos nem sei quem está ganhando os campeonatos, mas uma
coisa tenho por certa, trata-se de uma arte imperfeita, afinal é executada com
os pés. É inexorável o erro humano e o que considero curioso no futebol, é que ninguém estranha o 0 x 0 e uma única partida é capaz de formar contradições
como as grandes questões ontológicas. As contendas entre os autores gregos
também eram permeadas de paixões.
Passeando pelas redes sociais da internet
em dia das grandes partidas, vendo comentários dos torcedores fico pensando,
como a vida o futebol não é justo e ao que parece os bons nem sempre vencem. A
sorte compete e colabora com o mérito, qualquer gol é válido, do mais magistral
ao mais canhestro. A mimese futebolística alcança a pós modernidade, qualquer
vídeo da Copa do Mundo de 1986, dá para ver o Deus Maradona vingando sua nação
da humilhação das Maldivas marcando gol contra a Inglaterra, os argentinos
enlouquecidos o veneram até hoje.
O mundo em que vivemos somos
acossados por todos os meios de apelo para que sejamos ricos, belos, magros, com
função sexual permanente, antideprimidos. Mas o inevitável é que a melancolia
se apresenta e a arte do futebol se impõem como crítica, como política enfim.
Um novo ano começa então vou vestir minha camisa, inflar minhas paixões e
acompanhar o mundial, afinal, futebol também é cultura.
Lembrei do filósofo Albert Camus, dizendo que os melhores traços de sua conduta moral aprendeu por meio do futebol.
ResponderExcluirFelipe não conhecia a citação, interessante!!
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