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sexta-feira, 22 de novembro de 2013

AS CIDADES INVISÍVEIS DE ÍTALO CALVINO





            Esse texto do Ítalo Calvino se tornou inesquecível para mim porque fiz uma citação dele na minha dissertação de mestrado e o meu orientador me pediu para retirar e eu não o fiz. Calvino era minha identidade maior com a temática da cidade como um todo, que eu tratava no trabalho de dissertação. O seu texto é tão impactante que provoca transformações após a leitura, muda-se o olhar que se tem diante das cidades. 


Moro a mais de dez anos na mesma cidade, e durante esse período venho acompanhando seu crescimento e suas mudanças, e mais do que nunca vejo a tese suscitada pelo livro como atual, afinal existem múltiplas cidades dentro de uma só, variando de acordo com os grupos sociais. Quando eu morava no trecho leste a cidade tinha uma cara, cheiros e sabores, mais regionais e aparência menos urbanizada, quando me mudei para o oeste encontrei uma outra cidade, mais próspera, mais urbaniza, mas no entanto, mais quente.


            Essas reflexões trazidas pela obra, nos coloca diante de uma das mais agradáveis produções do século XX, onde o autor lhe dá as diretrizes para que você possa fazer as coisas do seu jeito. É um texto construído de forma a dá passagem a muitos outros espaços, ele mostra que uma cidade espelha-se na outra, gera outra, depende da outra num processo de apagamento de autoria única. Logo que iniciamos a leitura, temos aflorado uma ideia de espanto, não só pelos seus mistérios e segredos, mas pela indeterminação de imagens fugidias que tem as cidades.



            As cidades apresentadas são sempre afirmadas num não lugar, o que impossibilita de serem cartografadas e isso reafirma a potência virtual do texto. O interessante é a capacidade geométrica de articulação de Calvino, que divide a obra em onze blocos, cada bloco apresentando cinco cidades, chegando a um total de cinquenta e cinco. Essas cidades são deslocadas dentro da obra, e a leitura pode começar por qualquer uma, são textos curtos e independentes. O leitor tem ainda a opção de ler apenas o diálogo entre Marco Polo e o Grande Khan, ignorando o relato das cidades. Mesmo avulsas a histórias estabelecem entre si um fio condutor que é o de que não há cidade que não seja sujeita a mudanças.


            O mais curioso é que essas cidades imaginárias sempre têm nome de mulher através de caminhos que se abrem e se bifurcam e nunca se apresentam os mesmos, são elas: Diomira, Isidora, Dorotéia, Zaíra, Izaura, Marília, Zenóbia e tantas outras e escapam do controle humano, racional que oferecem surpresas constantes a todos os sentidos. Suas ruas e vielas nunca podem ser fixadas no papel, sendo comparadas por Marco Pólo aos caminhos das andorinhas que cortam o ar acima dos telhados, perfazem parábolas invisíveis com as asas rígidas, desviam-se para engolir um mosquito, voltam a subir em espiral rente a pináculo, sobranceiam todos os pontos da cidade de cada ponto de suas trilhas aéreas.


            A percepção que Ítalo Calvino desperta através do simbólico e da descrição de Marco Polo, que adentra o império de Kublai Khan traz a ideia de que é preciso superar as aparências e mostrar que as múltiplas cidades são somente uma. Eu particularmente, acredito que As Cidade Invisíveis são construções a partir de nossa memória, que é pilar e edificação de cada cidade. Uma coisa tenho por certo cada cidade só alcança significado, só toma forma a partir daquilo que atribuímos a ela, através de nossas lembranças, vínculos e identificações. 

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

QUANDO LI O REMORSO DE BALTAZAR SERAPIÃO



            Quando descobri esse livro do autor português Valter Hugo Mãe, confesso que senti um certo estranhamento, primeiro pelo tom regionalista, pela proximidade com o realismo mágico, linguagem meio arcaica e o mais interessante a abolição de palavras maiúsculas como uma espécie de reviver a modernidade. Mas, essas impressões foram desconstruídas ao final da leitura. Isso prova que no campo da literatura nada se pode excluir da novidade artística.


            A escrita é inspirada numa retórica de cunho medieval, exprimindo o conhecimento de gente simples, as mesmas gentes que atribuem a uma explicação sobrenatural tudo aquilo que não conseguem explicar. Num mundo medieval, os feudais abusam dos seus direitos. Baltazar, o protagonista deste romance, foi criado com a pobreza e com a violência numa família em que a vaca, animal de estimação, parece, afinal, ter tanta importância como a mãe. Porém, no meio da escuridão, Baltazar vê a luz: Chama-se Ermesinda e é a mais bela e ajuizada da aldeia. E o casamento acontece como uma benção dos céus, preparando-se Baltazar para a educação esmerada da sua esposa, uma vez que as mulheres, já se sabe, são ignorantes e, também por isso, muito perigosas. Mas, essa é vítima de violência física, psicológica e sexual.


            Esse tratamento medieval que se dava as mulheres nasce do desejo de tratar a mulher pelo terror exatamente como se fazia com os animais. Com esse livro sinto que a palavra escrita está mais viva do que nunca, para aqueles que a dominam como prova o texto. É uma prosa diferente de tudo o que eu tinha visto nos últimos tempos, uma metáfora da violência doméstica ainda comum nos jornais atualmente.


            Valter Hugo Mãe é assim, a minha mais nova paixão literária. A escrita me agrada porque é sentida, emotiva, dura, chega a suscitar o pensamento de como alguém é capaz de escrever sobre isto? Lendo o texto me sinto um pouco no mundo de Saramago, e isso muito me agrada. O livro é duro, mas realista, próprio do lado mais agressivo e irracional do ser humano. Li em 24 horas, leitura impactante que vale a experiência.


terça-feira, 12 de novembro de 2013

QUANDO LI TRAVESSURAS DA MENINA MÁ



            Acho que leitura boa é aquela que você faz de um fôlego só, quando li Travessuras da Menina do Peruano Mario Vargas Llosa fiz em dois dias, a obra, é daqueles tipos de livros que casam com o nosso humor e nossa vontade de sumir do mundo e de tudo a nossa volta, foi essa impressão que  tive da leitura. Ricardo Somucurcio, é um peruano que tem como único sonho e ambição na vida morar em Paris, o que dá uma aura de magnitude ainda maior a Cidade.


            Ele é um rapaz simples, e modesto que na infância se apaixona por uma garota chilena, muito difícil de ser conquista Lily, são várias as tentativas de conquista, todas em vão, mas esse encontro muda a vida completamente. Essa paixão persiste por toda a vida de Ricardo e o melhor da estória é a contextualização histórica dos vários encontros que ambos têm durante a vida.


            Eles se encontram em diversas fases e facetas, na Paris bela e revolucionária, na Londres dos Skins Heads e do “paz e amor” dos hippies, na Tóquio das máfias e dos prazeres extravagantes, e na Madri dos anos 1980. Nesses encontros e partidas, conquistas e derrotas, sempre a mesma pergunta é feita pela malvada Lily: ainda me ama Ricardito?


            Ela ambiciosa, gosta de luxo e riqueza, vida impossível de ser dada pelo trabalho de modesto tradutor de Ricardito. Ela sempre quis conquistar o mundo, ele apenas ela. Nesses encontros e desencontros que se cruzam ela se mostra diferente e mesmo assim ele é capaz de ama-la. A montagem da obra é genial, e mostra como que o amor pode ser uma droga, e me deixou uma pergunta que está longe de ser respondida por mim, e acho que por qualquer pessoa: qual a verdadeira face do amor? 

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

PENSANDO A HISTÓRIA DA BELEZA DE UMBERTO ECO



História da beleza de Umberto Eco, é daqueles livros que quando lançado se torna automaticamente objeto de desejo para leitores vorazes e amantes de livros como eu. Seja bela sua bela edição, com imagens memoráveis, seja pelo feito de levar erudição a leitores comuns. São 400 páginas de ideias, textos históricos e ilustrações. O que realmente me cativou por desejar tanto e comprar a obra, é a erudição de Eco conhecido por livros como O Nome da Rosa, consegue aqui, ser erudito sem ser pedante.


O autor percorre a linha da história para falar sobre beleza, indo por Grécia e Roma Antiga, Idade Média e Renascimento, passando pela estética vitoriana do século XIX. O livro se apoia em textos de notáveis como Eric Hobsbawm, Dante, Kant, Hegel e Kafka. Lendo o texto me senti fazendo uma viagem pela história do homem, da arte e sobretudo do olhar que se tem da estética, que é a apuração da ideia de beleza.


A obra anima um espírito que me agrada de sobremaneira, é entender que a beleza não é um dado absoluto, mas uma variante histórica, geográfica e cultural. Daí ser traçada essa linha que explica a beleza que vai da antiguidade, a sociedade de consumo do século XX.


Mas, observando História da Beleza, apesar de Eco, não o considerar assim, tenho a impressão que estou diante de um livro de arte, ou um livro de que tem como interlocutores os estudiosos da arte. E acho que peca, por não situar as citações que apresenta em seus contextos culturais e historiográficos.


O argumento que ele apresenta é de fácil compreensão, não será o mundo que a beleza tomará como modelo, nem tampouco o homem tal como se situa nesse mundo, mas sim, o homem cria o belo a imagem e semelhança a forma como vê e se representa. É nesse sentido que a beleza é um elemento da história, pois é um entendimento do homem consigo mesmo.


Em sua análise da contemporaneidade, podemos dizer que este carrega nas tintas do romantismo, ao ver nosso tempo, como simples regeneração e corrupção de um passado que antes era maravilhoso, pois a beleza hoje, é degenerada e prostituída, sendo considerada pelas campanhas publicitárias, tanto a beleza nórdica de Claudia Schiffer, quanto a beleza de origem afro de Naomi Campbell. Numa única campanha publicitária é possível se reunir o universo oitocentista e elementos de ficção científica.


Não obstante as limitações metodológicas, História da beleza reúne em si, pelas gravuras, imagens e textos que apresenta, a materialização do belo e como diz o próprio Eco o belo é aquilo que agrada de maneira desinteressada, aquilo que provoca prazer aos nossos sentidos, deve ser por isso, que é tão prazerosa a experiência com este livro, que chega a ser uma aventura intelectual, apaixonante e emotiva.