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quarta-feira, 24 de setembro de 2014

NARCISISMO DA NOSSA ERA


Lembro perfeitamente que uma das primeiras histórias que me impressionou foi o mito grego de Narciso o belo rapaz que para ter vida longa não poderia se ver, quando ele se viu ficou tão enamorado de sua beleza que fundiu-se consigo mesmo e afogou-se na própria imagem. Esse mito nunca foi tão atual para pensar o contexto em que vivemos onde um dos maiores valores da nossa época é a exposição. Somos vítimas e reprodutores de sua lógica.


Vejo uma certa patologia no exacerbamento do narcisimo contemporâneo, indo além daquilo que Freud escreveu a 100 anos em seu texto Introdução ao Narcisismo. Muitos autores, dentre eles Bauman, o sociólogo, mostra que ascensão social está guiada necessariamente pelo crescimento material, os indivíduos tendem a se fechar em si mesmos fugindo da hostilidade do mundo e supervalorizando suas imagens para compensar seus vazios existências e se expondo cada vez mais intimamente em especial nas redes sociais.


O que interessa hoje é sair bem na foto, a aparência associada a exposição material nunca foi tão valorizada. Principalmente se o cenário for um por de sol cobiçado, uma praia paradisíaca, um restaurante da moda, uma loja badalada, um hotel caro. Quando não se tem imagem para comprovar, ou não há tempo para faze-lo se expõem a localização geográfica com precisão cirúrgica. Quando eu estudei fotografia meu professor mostrava um lado curioso, a fotografia expõe um certo que melancólico ao mostrar aquilo que já não é, o instante fugidio de uma coisa viva. Nesse sentido o auto retrato tão banalizado hoje (selfie) é o contrário porque seu objetivo não é o outro, mas a auto afirmação.  



            No entanto, não quero generalizar, longe de mim pensar que todos que fazem selfie  sofram de narcisimo patológico, o que se peca é pelo excesso. Mas, não posso deixar de perceber, nem de indicar que se trata de um sintoma do nosso tempo, de uma sociedade que investe cada vez mais na fugacidade e na banalidade de uma profusão de imagens mortas. Contudo, não deixo de pensar talvez esse modo de aparecer, seja o nosso novo modo de ser.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

SELFIE: O EGOCENTRISMO COLETIVO


Esses dias estive pensando na moderna obsessão da maioria das pessoas em se fotografar freneticamente seja em espelhos de banheiros, academias, bares ou qualquer lugar que possa faze-lo. O tal do “selfie” é a febre do momento todos querem, todos fazem. Junte-se a isso, a mania que vem crescendo nos últimos anos a de fotografar as comidas, seja nos restaurantes ou em casa. Parece que comer ficou em segundo plano, deixe o prato esfriar, em primeiro lugar vem fotografar. Mesmo que seja um simples mexido de segunda feira a noite tem que ser imediatamente publicado em redes sociais como face book e instagram.


Mas a moda “selfie” (publicar em redes sociais fotos que a pessoa tira do próprio rosto), superou tudo até a mania que considero irritante de fotografar a comida. Hoje cada um com seu celular cheio de recursos tecnológicos dirige o filme da própria vida, onde cada um, logicamente é a estrela e protagonista. E tome pose blasé, olhares fatais, cabelos arrumados e biquinhos (ah o infame biquinho) sensuais, caras e bocas não faltam. O “selfie” não tem classe social, muito menos limites.



Me sinto num surto coletivo de egocentrismo e hedonismo. Parece que a maioria das pessoas não faz questão de companhia, já que o principal parceiro e companheiro é o telefone celular. No mais acho que estou velha já que me assusto com fotos publicadas em funerais, banheiros, hospitais, mesas de família e em outros lugares que a pouco tempo seriam inimagináveis.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

NOSSO ORGULHO DE CADA DIA



            Acredito que o orgulho e a soberba é a característica humana mais fundamental que ninguém pode dizer que não têm. As teologias ocidentais, desenvolveram tratados sobre a natureza humana que expõem o orgulho como a principal origem de todos os defeitos humanos. Na tradição judaico cristã, o orgulho é atribuído a Lúcifer, aquele que era o mais belo dos arcanjos e foi o primeiro ser da criação que trabalhou a ideia do eu, em detrimento do nós. É o momento em que o ser se considera superior, que acredita que pode ser igual a Deus e toma sua própria iniciativa. Na teologia medieval a nobreza era mais vaidosa do que os pobres, na teologia contemporânea, intelectuais, jornalistas, médicos, políticos e artistas, são categorias por excelência vaidosas.


            A pessoa virtuosa, a mulher fiel, o filho exemplar, o marido bom cometem o pecado de dizer: eu não sou como a mulher adúltera, o filho rebelde, o marido ruim. Por traz de cada virtude há uma exuberância que o aproxima do vício e da vaidade. O mito mais rico da vaidade é aquele que encontramos na ideia de Narciso, que quando vê sua imagem se apaixona por si, é aí que está definido o instrumento básico da vaidade, o reflexo, o orgulho de si. Avançando na tradição filosófica em uma reflexão de Montaigne encontramos que a comparação com o outro nos faz muito mais mal do que bem, é a vida vivida para os outros, um dos pontos centrais da vaidade.


            A comparação com o outro, ou com que ele tenha é o que leva o espanhol Calderón de la Barca a pensar que se pudéssemos escolher a nossa vida, todo mundo escolheria de mandar e reger, ninguém escolheria sofrer e padecer, mas as pessoas não se dão conta que mandar e reger é representar, e padecer é viver. A realidade do mundo é parecer aos outros venturoso. A vaidade do mundo é parecer aos outros o quão sou importante, e isto é fundamental. As pessoas fazem qualquer coisa pela cena, são capazes de injetar no rosto, toxina botulínica, para parecerem jovens e saudáveis, não percebendo que é a partir daí que expõem suas idades.


            Nós não compartilhamos dores e fracassos, inundamos o facebook com sorrisos e uma vida linda. Colocamos em casa somente fotos que mostram todos felizes e harmônicos, é sempre a situação da família que eu gostaria de ter, ninguém mostra desarmonia. Ao ser representada a vaidade sempre foi atribuída as mulheres e é aí que reside um engano, porque o cuidado da mulher com a pintura do rosto, é equivalente ao cuidado do homem com a pintura do carro.


             A vaidade atual é sustenta em dois pilares: somos imortais; isso não acontecerá conosco, são eixos da atual teologia chamada de autoajuda, a reabilitação suprema da vaidade, que fundamenta que o orgulho de si é auto estima e não vaidade. Diferente do pensamento religioso que era a supressão do eu, ser virtuoso significava não traze-lo a tona. Daí recorro a Bauman quando ele diz que no Mundo Líquido, eu me torno a referência das coisas e passo a considerar a vaidade uma virtude.


O que existe hoje além da vaidade tradicional é o homem efêmero aquele, que posta a todo instante, nas redes sociais sua efemeridade como orgulho ao estilo: acordei; comprei; estou comendo. Como se a humanidade visse nesses fatos alguma relevância. Esse homem afirma para todos que ele é o bastante, que ele é muito. Instituímos agora a vaidade como virtude e não mais como pecado capital. Essa característica do individualismo é surgida na Grécia, reforçada pelo mundo do Renascimento e cultuada no mundo capitalista atual como a necessidade de ser único, especial, forte e onipresente.


A nossa vaidade não permite mais a falha, a tristeza, não se permite mais que se viva a dor e o fracasso, existem auxílios químicos para isso. Hoje, é preciso subir sem quedas, desde o início. Hoje não consertamos mais coisas, assim como não consertamos mais relações humanas, nos trocamos. E ao trocar sapatos, computadores e pessoas que amamos por outras vamos substituindo a dor do desgaste, pela vaidade da novidade. Os medievais acreditavam que tínhamos dentro de nós um demônio da soberba e da vaidade, como Lúcifer que um dia acreditou que poderia ser Deus, hoje esse demônio continua mais vivo do que nunca,  porque viver hoje é ser visto.

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

APARÊNCIA CORPORAL: UMA NECESSIDADE DA CONTEMPORANEIDADE





Vivemos em um momento histórico em que a valorização da aparência e do corpo se apresenta em seu período mais crucial, onde o investimento na imagem baseada na aparência é tema central de debate. A precariedade da carne com o envelhecimento progressivo e o descarte de produtos que alimentam a cadeia da aparência, permeiam o imaginário social relativo ao descrédito com o corpo real e com uma aparência menos elaborada.


            A busca na atualidade é por um corpo perfeito onde a aparência trabalhada na aquisição do consumo, é o local de expressão da felicidade e da representação da identidade social, caminhando tudo para a lógica da mercadoria do sistema capitalista. Vivemos em uma época em que o corpo além de ser cultuado é coisificado, a TV, o cinema, a medicina, a publicidade, a moda, os esportes asseguram seu sucesso, sua valorização, e colocam a aparência corporal como núcleo do glamour, da prosperidade, da saúde e da felicidade humana.


            Esse entendimento é contraditório com a realidade cotidiana que se apresenta de forma instável, caótica e incerta. A contemporaneidade apresenta um cenário de desemprego, violência, miséria, doenças, crises econômicas e ecológicas. A realidade do mundo da fama e o espetáculo das imagens contribuem para que o próprio corpo seja considerado a única coisa que resta ao ser.


            A reflexão em torno da temática da aparência se mostra mais relevante se for levado em consideração os indícios que a sociedade contemporânea capitalista apresenta em toda parte, com a crescente obsessão pelo corpo, a aparência e a imagem que será projetada a partir disso. Não se trata de qualquer corpo, mas de um fabricado, construído, que apresente uma saúde perfeita. A aparência tem que ser fundamentada além do básico e o que passa a valer é a uniformização de produtos que representem luxo e glamour. A moda é a padronização dos usos desses produtos que constroem a aparência calçada na cultura do consumo.


            Nesse sentido, a cultura da aparência ganha espaços significativos na contemporaneidade, através dos meios de comunicação. O assunto circula na pauta de jornais e revistas, encartes de cultura e programas publicitários. Além disso, a obsessão atual pela construção da aparência como resposta a instabilidade, fragmentação e efemeridade marcam a vida social, ajudando no entendimento da centralidade assumida pela cultura da aparência na sociedade contemporânea. Neste sentido, a mídia é um elemento influenciador, pois apresenta um desejo de modelo corporal dito ideal. A preocupação com a aparência atinge traços de obsessão e está cada vez mais enraizada em todas as profissões e idades.