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quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

NOSSO ORGULHO DE CADA DIA



            Acredito que o orgulho e a soberba é a característica humana mais fundamental que ninguém pode dizer que não têm. As teologias ocidentais, desenvolveram tratados sobre a natureza humana que expõem o orgulho como a principal origem de todos os defeitos humanos. Na tradição judaico cristã, o orgulho é atribuído a Lúcifer, aquele que era o mais belo dos arcanjos e foi o primeiro ser da criação que trabalhou a ideia do eu, em detrimento do nós. É o momento em que o ser se considera superior, que acredita que pode ser igual a Deus e toma sua própria iniciativa. Na teologia medieval a nobreza era mais vaidosa do que os pobres, na teologia contemporânea, intelectuais, jornalistas, médicos, políticos e artistas, são categorias por excelência vaidosas.


            A pessoa virtuosa, a mulher fiel, o filho exemplar, o marido bom cometem o pecado de dizer: eu não sou como a mulher adúltera, o filho rebelde, o marido ruim. Por traz de cada virtude há uma exuberância que o aproxima do vício e da vaidade. O mito mais rico da vaidade é aquele que encontramos na ideia de Narciso, que quando vê sua imagem se apaixona por si, é aí que está definido o instrumento básico da vaidade, o reflexo, o orgulho de si. Avançando na tradição filosófica em uma reflexão de Montaigne encontramos que a comparação com o outro nos faz muito mais mal do que bem, é a vida vivida para os outros, um dos pontos centrais da vaidade.


            A comparação com o outro, ou com que ele tenha é o que leva o espanhol Calderón de la Barca a pensar que se pudéssemos escolher a nossa vida, todo mundo escolheria de mandar e reger, ninguém escolheria sofrer e padecer, mas as pessoas não se dão conta que mandar e reger é representar, e padecer é viver. A realidade do mundo é parecer aos outros venturoso. A vaidade do mundo é parecer aos outros o quão sou importante, e isto é fundamental. As pessoas fazem qualquer coisa pela cena, são capazes de injetar no rosto, toxina botulínica, para parecerem jovens e saudáveis, não percebendo que é a partir daí que expõem suas idades.


            Nós não compartilhamos dores e fracassos, inundamos o facebook com sorrisos e uma vida linda. Colocamos em casa somente fotos que mostram todos felizes e harmônicos, é sempre a situação da família que eu gostaria de ter, ninguém mostra desarmonia. Ao ser representada a vaidade sempre foi atribuída as mulheres e é aí que reside um engano, porque o cuidado da mulher com a pintura do rosto, é equivalente ao cuidado do homem com a pintura do carro.


             A vaidade atual é sustenta em dois pilares: somos imortais; isso não acontecerá conosco, são eixos da atual teologia chamada de autoajuda, a reabilitação suprema da vaidade, que fundamenta que o orgulho de si é auto estima e não vaidade. Diferente do pensamento religioso que era a supressão do eu, ser virtuoso significava não traze-lo a tona. Daí recorro a Bauman quando ele diz que no Mundo Líquido, eu me torno a referência das coisas e passo a considerar a vaidade uma virtude.


O que existe hoje além da vaidade tradicional é o homem efêmero aquele, que posta a todo instante, nas redes sociais sua efemeridade como orgulho ao estilo: acordei; comprei; estou comendo. Como se a humanidade visse nesses fatos alguma relevância. Esse homem afirma para todos que ele é o bastante, que ele é muito. Instituímos agora a vaidade como virtude e não mais como pecado capital. Essa característica do individualismo é surgida na Grécia, reforçada pelo mundo do Renascimento e cultuada no mundo capitalista atual como a necessidade de ser único, especial, forte e onipresente.


A nossa vaidade não permite mais a falha, a tristeza, não se permite mais que se viva a dor e o fracasso, existem auxílios químicos para isso. Hoje, é preciso subir sem quedas, desde o início. Hoje não consertamos mais coisas, assim como não consertamos mais relações humanas, nos trocamos. E ao trocar sapatos, computadores e pessoas que amamos por outras vamos substituindo a dor do desgaste, pela vaidade da novidade. Os medievais acreditavam que tínhamos dentro de nós um demônio da soberba e da vaidade, como Lúcifer que um dia acreditou que poderia ser Deus, hoje esse demônio continua mais vivo do que nunca,  porque viver hoje é ser visto.