quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

CALLADO: O PAI DO CHORINHO NACIONAL



            Quando escuto chorinho, não tem como não ser reportada a uma ideia de uma música genuinamente nacional, apesar de muitos considerar como música de natureza mais folclórica, é inegável sua leveza, alegria e musicalidade transbordante. Foi com o chorinho que o Brasil descobriu o seu som. O flautista e compositor carioca Joaquim Callado (1848-80), foi uma figura fundamental nesse cenário musical. Considerado o pai do choro e autor de mais de 600 canções.


            Em 1876, Machado de Assis fez um elogio rasgado a Callado em sua coluna quinzenal na revista Ilustração Brasileira. Machado diz não levara a sério muitos deles, mas a respeito de Callado diz: foram convidar um lacedemônio a ouvir um homem que imitava com a boca o canto do rouxinol. Eu já ouvi o rouxinol respondeu ele. A mim quando me falarem de um homem que tocava flauta com as próprias mãos eu respondi: eu já ouvi o Callado.


            Além de tocar divinamente Callado compunha músicas com uma batida diferente, sincopada, que daria origem ao choro. É bom lembrar no entanto, que na época de Callado o choro era mais uma maneira de tocar do que propriamente um estilo musical. Ainda não havia uma música popular brasileira consolidada. Ouvia-se o lundu de origem africana e estilos como a polca e a mazurca, músicas de salão europeias. A polca parece ter sido a mais contagiante, porque oferecia a oportunidade de pela primeira vez dançar juntinho. A formalidade da valsa e outras danças de salão começava a ficar para trás.


            Essa nova música que nascia sob a flauta de Callado, viria a se tornar a coroa do Brasil. Callado e sua música eram discriminados pelos grandes salões, porque ouvir o erudito era considerado chique. Ele foi criativo, acima de tudo e teve a coragem de arriscar num ambiente impregnado de referências europeias. A partir daí a síncopa passou a ser característica da música popular brasileira, era a hora e a vez do novo som, e da formação da identidade musical brasileira, com notável contribuição de Joaquim Callado.
            

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

TEATRO DE REVISTA NO BRASIL



            Dos vídeos do You tube estão entre os meus favoritos aqueles que trazem filmes com números do chamado Teatro de Revista, com artistas como Zé Trindade, Virgínia Lane, Renata Fronzzi, Emilinha Borba dentre outros. Os filmes são dos anos 1950, e estão enquadrados no gênero das chamadas chanchadas, filmes carnavalescos comuns nesse período produzidos pela Atlântica a mais famosa produtora carioca da época, com enredos simples, populares que em sua maioria parodiavam sucessos do cinema americano com o popular Teatro de Revista.


            O Teatro de Revista buscava a interação com o público era uma revisão de costumes em que se ironizava e se sondava a alma brasileira. No enredo via-se sempre alguém perdido, perseguido. Os personagens parecem caricaturas, alegorias, com atores que tenham um caráter de improvisação, espontânea, como Oscarito e Grande Otelo, Dercy Gonçalves e Zé Trindade. À este ator cabia, dançar, cantar, possuir o tempo da comédia e a agilidade do improviso.



            Mas a grande atração eram as atrizes que cantavam, dançavam e rebolavam dentro de seus maiôs, com uma sensualidade provocativa numa sociedade que ainda se via pudica, mas que a olhos contemporâneos, chega a parecer inocente. Chamadas de vedetes, receberam influencia francesa, o que pode ser visto com as plumas, o sotaque francês e a bossa como um todo, isso deslumbrou o povo, esse teatro foi se transformando até adquirir características nacionais peculiares que culminam no que pode se definir como uma identidade genuinamente brasileira do gênero.

Para ser vedete, era preciso ser bonita e escultural, e representava na Revista, o último número do espetáculo, era a apoteose. Em 1950, Virginia Lane recebeu do Presidente Vargas o título A Vedete do Brasil, era tão fantástica que nem ele resistiu aos seus apelos, mantendo com ele um discreto caso amoroso por 15 anos. Fez 37 filmes durante sua carreira, hoje sua indefectível apresentação de Sassaricando chega a ser cult. Outras famosas da época foram: Renata Fronzzi, Elvira Pagã e nos anos 1940 Luz del Fogo, primeira naturista brasileira.

A vida particular das vedetes era o que causava interesse e aumentava o seu sucesso, Elvira Pagã, no início da década de 1950 na praia de Copacabana foi a criadora do biquíni, exalava sexualidade e enlouquecia a constante plateia feminina. Era manchete permanente de escândalos, a bomba que escandalizava a preconceituosa sociedade da época. Chegou a ser impedida de entrar no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, frequentado pela alta sociedade da época.

Gosto de ver os vídeos porque considero que é a melhor forma artística que representou a ideia que o Brasil tinha de si, onde é possível reconhecer a sociedade brasileira nos palcos e traçar uma identidade cultural do país. O interessante é que não se abdicava em suas apresentações do olhar crítico e irônico dos acontecimentos sociais da época. Eram produções recheadas de humor e duplo sentido, apesar de ser um gênero marginalizado, considerado menor, enriqueceram a produção nacional e dialogaram muito bem com o mundo de então. 

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

UM SONHO DE LIBERDADE



            Um Sonho de Liberdade mais do que um filme é uma experiência espiritual, que cria uma expressão tão calorosa em nossos sentimentos que é capaz de nos fazer sentir membros de uma família. O filme flui lentamente seguindo o ritmo calmo e observador de seu narrador. É mais profundo do que a maioria dos filmes e traz como mensagem fundamental a continuidade de uma existência baseada em esperança e amizade.


            A cena de início do filme mostra o condenado, o banqueiro Andy, recebendo prisão perpétua pela morte da esposa e do amante. E o personagem de Morgan Friedman narrando a primeira vez que o viu. Desde a chegada de Andy no ônibus da prisão até o final do filme nos só vemos como os outros o veem. A história é construída de forma diferente nos fazendo questionar se Andy, realmente matou aquelas pessoas? Ou porque ele é tão introspecto. Não é uma história centrada num herói bravo e destemido, que seria o convencional.


            Boa parte do filme envolve muda solidão e reflexão filosófica sobre a existência. O personagem de Morgan Friedman é o condutor espiritual do filme nos o vemos em três audiências de condicional,  depois de vinte, trinta e quarenta anos. Na primeira ele tenta convencer a junta que está reabilitado, na segunda ele finge e na terceira ele rejeita, qualquer forma de liberdade e o interessante é que ao fazer isso ele deixa seu espírito livre.


            O filme foi construído para nos fazer observar a história e não para distrair a plateia. Acho que distração é o que tem de muito pouco nesse filme. Os atores gostam de desempenhar os seus papéis. A história se desenrola de forma ordenada, e o filme reflete a longa passagem das décadas. O personagem de Morgan Friedman reflete e diz: quando eles colocam você na cela, quando aquelas barras de ferro batem violentamente cerrando as portas, então você sabe que é verdade. A velha vida desaparece, nada resta a você além de todo o tempo do mundo para pensar a vida.


            Revendo o filme, eu o admirei mais do que a primeira vez. O apreço por bons filmes, cresce com a familiaridade, assim como acontece com a música. Alguns costumam dizer que a vida é uma prisão, essa prisão pode ser por motivo de escolhas ou por se está doente, sendo assim, somos Red, o personagem de Friedman e o nosso redentor é Andy. O filme é uma obra de arte que trata de uma coisa mais profunda do que ele seja capaz de admitir. 

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

A TAL FELICIDADE



Já falei em outros momentos aqui no blog sobre a felicidade que acredito a priori ser o objetivo maior da nossa existência, embora entenda que o primeiro fundamento desse princípio, deve ser a incerteza. Esse é um tema que perturba, impressiona e tem a capacidade de comover as pessoas. Não temos certeza do que é, mas somos convocados a todo tempo para buscar essa tal felicidade.  Embora já tenha tentado construir conceitos sobre o assunto, hoje compreendo que só é possível falar em felicidade num nível de dúvida.


Ao longo da história do pensamento, sempre se tentou responder justamente essa pergunta, o que é a felicidade? E foi aí que se criaram regras para ela e é assim que impomos uns aos outros os nossos paradigmas. O que pode nos salvar desses deveres para com a felicidade, é justamente a interrogação que deveria ser um exercício cotidiano. Pensando e duvidando de conceitos é possível buscar e construir nossa própria felicidade, não como algo pronto e acabado, mas como algo capaz de ser construído não como o ideal pronto e realizado, mas como uma aventura que é gestada a partir do nosso próprio cotidiano.


Em nossos tempos atuais, ser feliz é praticamente uma obrigação, que nos é lançada, sobretudo, por meios de comunicação, e podemos muito bem dizer que a felicidade dos nossos dias foi cativada pela publicidade. Mas mesmo assim, não devemos abrir mão desse termo, mesmo após sua transformação em uma mercadoria, capaz de vender outras mercadorias. A felicidade surge inicialmente nos textos dos filósofos da antiguidade grega. Naquele momento, eles estavam preocupados em entender como alguém pode ser feliz sem precisar da intervenção de uma força maior, ou seja, como posso ser feliz chamando apenas aquilo que tenho dentro de mim?



A questão é o que que você enquanto ser individual é capaz de fazer junto a outros seres humanos para ser feliz consigo mesmo? E é aí que a felicidade se insere no campo da ética, que é de modo geral algo que fazemos com o outro. Essa ideia do nosso tempo de ser feliz, é uma imposição do outro, a gente só quer ser feliz porque existe um ordenamento social e cultural que nos exige isso.



Reafirmo e aceito o pensamento dos gregos, o ser humano consegue ser feliz quando ele mesmo se torna virtuoso, e encontra o equilíbrio interior entre o bem e o mal, pois seria virtude do ser humano a mistura que resulta na capacidade de cometer erros e acertos, sendo assim, a felicidade seria o encontro daquilo que sou capaz de compreender em relação a própria vida que vivo, o encontro do meu pensamento com a minha ação.



Tenho a impressão que existem muitas pessoas que vivem como se a vida fosse algo de plástico, como se ela não fosse de concreto, na verdade, a vida é muito pesada. Todos mais cedo ou mais tarde irão vivenciar uma coisa que chamo de dor de existir. Nietzsche entendia que para ser feliz, basta está vivo, porque viver é algo bonito e nesse ponto ele está correto, porque viver é uma infinitude de possibilidades e é a chance que temos de experimentar a condição humana. Já que fora disso não temos a certeza racionalista que existe algo.



Por isso, entendo que felicidade é a capacidade que cada um de nós tem de inventar essa sensação para si mesmo, já que cada um pode desenhar a sua ideia de felicidade. Nesse sentido, Kant tinha razão, talvez a gente não possa ser feliz num sentido total metafísico, mas apenas no sentido de termos feito tudo que estava a nosso alcance para botar a cabeça no travesseiro e ficar numa boa. Afinal, a vida não é sonho.