sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

REVENDO CLARICE



            Em vários momentos de minha vida, inusitadamente os mais difíceis sempre recorri a obra de Clarice Lispector, credito ao seu livro A Descoberta do Mundo, grande parte do meu entendimento sobre o mundo. Clarice revela sua alma através de sua escrita, em trechos simples pode-se sentir isso como: por que o cão é tão livre? Porque ele é o mistério vivo que não se indaga.


            Filha de família Judia, Clarice nasceu em 1920 na Ucrânia, criou-se no Nordeste brasileiro e fez carreira no jornalismo e na literatura no Rio de Janeiro, então capital do país. Viveu o Rio em seu apogeu de cidade culta, cosmopolita, centro do poder político nacional e ainda sem a barbárie atual.


            Marcou desde a estreia a impressão crítica e do leitores por traços raros no cenário da língua portuguesa: fez diminuir o valor do enredo e arredou para o fundo do palco o registro da vida social que foi a tônica da geração anterior à sua no romance, tudo isso em favor de uma elaboração mais sutil da linguagem, um empenho para imprimir na superfície do texto as tensões profundas de suas personagens.


            Ela sempre foi mais do que uma novidade psicológica, mas alguém que tinha uma tentativa de fazer a linguagem ser ela mesma um elemento de interesse para o leitor, que era convocado a aderir a ficção num patamar inédito no Brasil. Sua obra durante a sua vida só cresceu, ela queria que a revelação se fizesse ali, diante dos olhos do leitor diante daquelas palavras que sua prosa ia dispondo por meio de frases enganosamente lineares.


             Clarice sempre me deu alimento, com sua ficção que se vale de traços auto piedosos, o que nem de longe apaga a força dos seus acertos, que ocorrem especialmente quando sua literatura confronta os limites da representação do real vivido. Sua escrita é tão profunda que ela queria a vida e a arte ao mesmo tempo. 

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