domingo, 17 de novembro de 2013

A CONSTRUÇÃO SOCIAL DO AMOR ROMÂNTICO



            Ontem fui a um casamento e diante do simbolismo e da carga de emotividade da cerimonia me questionei quando construíram a ideia de amor romântico? O amor romântico é um dos maiores sistemas energéticos do pensamento coletivo na nossa cultura, acredito que chega mesmo a transcender a religião, espaço em que as pessoas procuram transcendência, plenitude e sentido para a vida.


            Como fenômeno massificado, o amor romântico é uma invenção do Ocidente, estamos tão acostumados a ele que imaginamos ser essa a única forma de amor, ou o amor verdadeiro. Nas culturas orientais, por exemplo na Índia, encontramos que os casais se amam com cordialidade, devoção e estabilidade que chegamos a desconhecer. Eles não impõem aos seus relacionamentos os mesmos ideais que impomos aos nossos, nem fazem exigências inimagináveis, nem alimentam as expectativas que temos.


            O ideal de amor romântico chegou a seu auge no século XIX, nas primeiras décadas do século XX, o sexo era inseparável do amor e do laço conjugal. O ideal romântico integra a sexualidade natural do homem com o amor e o casamento propondo intenções recíprocas e indissolúveis. Assim, esse amor romântico que chegou a nossa contemporaneidade é construído com base numa combinação de ideais crenças e expectativas. Influenciados por esses modelos de comportamento, de forma inconsciente, predeterminamos como deve ser o relacionamento com a outra pessoa, o que devemos fazer e o que vamos lucrar.


            No amor romântico não basta amar, é preciso está apaixonado, que é a sensação de êxtase que o nosso parceiro tem que constantemente nos alimentar com a emoção intensa que a paixão proporciona. O mundo ocidental nos dá a sensação de que estamos sempre com razão e daí achamos que o amor romântico é o certo, o único possível de nos proporcionar a tão sonhada felicidade.


            Levando em consideração o número de casamentos desfeitos e de relacionamentos amorosos fugazes, dá para intuir que o amor romântico não está dando muito certo, acredito que é preciso, a libertação de nossas presunções e expectativas inconscientes, porque daí será possível atingir um novo patamar nos relacionamentos e sobretudo, uma nova consciência de nós mesmos.
            

sábado, 16 de novembro de 2013

BAUDELAIRE CONTINUA ATUAL



Revendo o relevante texto As Flores do Mal de Charles Baudelaire, vejo o quanto este continua atual no mundo em que vivemos. Em tempos de Internet e redes sociais, o aspecto da formação da pessoa humana deixa a desejar. A tecnologia ameaça nos isolar das interações mais verdadeiras, a efemeridade da vida atua criando uma agonia em grande parte da população, as quais vivem na razão de submissão a vida, encontrando saídas no fictício cyber espaço e criando angústias das mais diversas naturezas.


Em As Flores do Mal Baudelaire, antecipa essa angústia que a modernidade traz para a vida do homem, percebemos nos poemas sua insatisfação em relação ao progresso da Modernidade, e a substituição do homem pela máquina, o que levava o homem moderno a pensar que estava perdendo a sua própria identidade. O homem moderno estava perdido em sua época, valendo-se de várias identidades para sobreviver.


Para Baudelaire, a modernidade é a reconstrução e a afobação da humanidade na grande metrópole de Paris. Nada para ele é mais moderno do que a vida nas grandes cidades. O que seria então essa modernidade para o poeta? Seria a ideia de conflito, pois, provoca angústia e perda de aceleração, e é aí que reside o centro de aceleração cotidiana da vida moderna.


Baudelaire não vivia nos salões nobres de Paris, mas na vida boêmia francesa, carregada de extravagancias e conflitos que marcou a existência de sua época. Contudo, é considerado um dos maiores pensadores franceses de todos os tempos. Pela sua ousadia, tornou-se modelo para o século XX, influenciando as poesias de cunho simbolista.


Para ele o principal motivo de angustia do homem, é a fragmentação que ele está se deparando por consequência da modernidade. Nosso poeta é tão atual que acreditava que o avanço do moderno no século XIX, tinha rompido o laço de confiança das relações intrapessoais, tudo ficou muito passageiro, artificial, os homens têm medo de se relacionarem com os outros, porque se sentem fragmentados diante das grandes cidades.


Com sua poesia ele mostrou as divergências que a Cidade Luz oitocentista  estava passando, com o belo e o feio, as diferentes classes sociais dividindo o mesmo lugar. Acredito que Baudelaire é pertinente a nossa contemporaneidade e as nossas angústias, uma vez que temos a facilidade de observarmos com facilidade todas as transformações que ocorrem ao nosso redor, não cultivamos mais nossas reflexões, mas, nossos bens materiais, não buscar mais o flâneur pelas cidades, mas pelas vitrines das lojas de grife, assim, percebemos que o nosso flâneur está invertido não queremos refletir, mas possuir.


Seja pela nossa ânsia de nos comunicarmos por meio da comunicação virtual, seja por nossa necessidade de consumir, a angústia moderna permanece, como podemos ver nesse trecho: Sou como o rei sombrio de um país chuvoso, Rico, mais incapaz, moço e, no entanto idoso, [...] Não sabem mais que traje erótico vestir Para fazer este esqueleto enfim sorrir / O sábio que ouro lhe fabrica desconhece
Como extirpar-lhe ao ser a parte que apodrece, [...] (BAUDELAIRE, 1985, p. 295).


Nesse trecho fica evidente a fragilidade do homem moderno que tem tudo, mas não tem nada, sendo jovem percebeu-se idoso porque não pode atuar, as máquinas tomaram o lugar dos trabalhos artesanais. O homem da modernidade é o da incerteza do vazio que o norteia, das aparências que cultiva. O homem contemporâneo, vive de valores efêmeros, fragmentação, angustia existencial, daí, reside a atualidade do pensamento de Baudelaire.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

A BOA LEITURA DE 1889 DE LAURENTINO GOMES




Gosto de tudo que está relacionado ao Brasil, quando estava na academia procurava entender o país sob o ponto de vista de estudiosos que usavam como ponto de partida o método científico, comecei apresentando trabalhos com base no clássico Casa Grande e Senzala e daí entender o Brasil foi um tema que nunca mais saiu de mim. Além disso sou fascinada por história, em especial a chamada micro história, aquela que é mais próxima do mundo da história que não é contada pelos vencedores. Deve ser por isso que gosto tanto do trabalho do jornalista Laurentino Gomes, que com esse livro 1889 encerra uma bem sucedida trilogia sobre a história do país, os outros textos são 1808 e 1822.


Quando estava no mestrado me questionava quem vai ler minha dissertação? Terá eficácia prática ou ficará apenas arquivada e empoeirada em alguma estante de uma biblioteca de uma Universidade? Acredito ser esse o fim da maioria das teses, principalmente no Brasil, não atingem o grande público, e Laurentino Gomes com o seu trabalho, vai na contramão desse ostracismo, possibilita o alcance dos acontecimentos sobre o viés da micro história, ao grande público, os fatos que ele narra na trilogia foram essenciais para a formação e consolidação do país que temos.


Acredito que por sua linguagem objetiva, mais próxima da realidade é que seus livros são sucesso de crítica e de público, o que mostra que existe um grande contingente de pessoas interessadas em nossa história, talvez não o fizessem porque as opções que tínhamos no mercado eram emolduradas pelo rigor e pedantismo academicista.


Sua linguagem flui, ler o seu texto é como ler uma revista, com o mérito de está discutindo a formação do país, elemento primordial para compreendermos a nossa contemporaneidade. 1889, não traz novidades, nem está dividido através do rigor cronológico, os capítulos, mostram os dois lados da revolução e são divididos, entre outros, da seguinte forma: O Marechal, O Professor, D. Pedro II, A Redentora. Para mim o mais interessante é o capítulo que traça o perfil do Imperador D. Pedro II, ele humaniza a figura do homem que viveu pelo Brasil e para o Brasil, o seu relato é tão fiel, que nada fica a dever a nenhum acadêmico.


Sua imparcialidade no texto é notável, mas, sabe analisar com precisão os acontecimentos que narra, quando diz que a República se impôs, mas pela fragilidade da Monarquia do que propriamente pelo vigor do movimento republicano ou pela agilidade do Marechal Deodoro. Acredito que o grande mérito do livro está em mostrar um fato que os acadêmicos já trouxeram e agora com o livro chega a conhecimento de um número muito maior de pessoas, a falta do elemento povo, na participação da proclamação da República e da queda do antigo regime, o povo de forma apática via os novos donos do poder dominar o país e a família real ser expulsa de sua pátria e ninguém se pronunciar. Uma mostra da nossa inoperância e desorganização enquanto movimento social político, na defesa dos nossos direitos.


Outro fato que eu gostava de dizer em conversas e discussões sobre o assunto, parafraseando Machado de Assis era que uma grande maioria, aqueles que estão sempre perto do poder, independente de quem esteja no mando, o que importa é sombra que o manto público proporciona, foram dormir ideologicamente monarquistas e acordaram ideologicamente republicanos desde sempre e para concluir fico com a frase do Capitão Feliciano do Espírito Santo (bisavô do ex presidente Fernando Henrique Cardoso) Vocês fizeram a República que não serviu para nada. Aqui agora, como antes continuam mandando os Caiado”.


Está de parabéns Laurentino, por descrever de forma tão bem elaborada esses acontecimentos que foram as raízes da formação e do caráter do povo brasileiro, leitura que transcende o prazeroso, já que tem o condão de aguçar a nossa percepção dos sistemas políticos do país. 

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

QUANDO LI O REMORSO DE BALTAZAR SERAPIÃO



            Quando descobri esse livro do autor português Valter Hugo Mãe, confesso que senti um certo estranhamento, primeiro pelo tom regionalista, pela proximidade com o realismo mágico, linguagem meio arcaica e o mais interessante a abolição de palavras maiúsculas como uma espécie de reviver a modernidade. Mas, essas impressões foram desconstruídas ao final da leitura. Isso prova que no campo da literatura nada se pode excluir da novidade artística.


            A escrita é inspirada numa retórica de cunho medieval, exprimindo o conhecimento de gente simples, as mesmas gentes que atribuem a uma explicação sobrenatural tudo aquilo que não conseguem explicar. Num mundo medieval, os feudais abusam dos seus direitos. Baltazar, o protagonista deste romance, foi criado com a pobreza e com a violência numa família em que a vaca, animal de estimação, parece, afinal, ter tanta importância como a mãe. Porém, no meio da escuridão, Baltazar vê a luz: Chama-se Ermesinda e é a mais bela e ajuizada da aldeia. E o casamento acontece como uma benção dos céus, preparando-se Baltazar para a educação esmerada da sua esposa, uma vez que as mulheres, já se sabe, são ignorantes e, também por isso, muito perigosas. Mas, essa é vítima de violência física, psicológica e sexual.


            Esse tratamento medieval que se dava as mulheres nasce do desejo de tratar a mulher pelo terror exatamente como se fazia com os animais. Com esse livro sinto que a palavra escrita está mais viva do que nunca, para aqueles que a dominam como prova o texto. É uma prosa diferente de tudo o que eu tinha visto nos últimos tempos, uma metáfora da violência doméstica ainda comum nos jornais atualmente.


            Valter Hugo Mãe é assim, a minha mais nova paixão literária. A escrita me agrada porque é sentida, emotiva, dura, chega a suscitar o pensamento de como alguém é capaz de escrever sobre isto? Lendo o texto me sinto um pouco no mundo de Saramago, e isso muito me agrada. O livro é duro, mas realista, próprio do lado mais agressivo e irracional do ser humano. Li em 24 horas, leitura impactante que vale a experiência.