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quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

A TRADUÇÃO DO BRASIL EM GILBERTO FREYRE


            Casa Grande e Senzala foi o livro inaugural de minha vida acadêmica, assim como a discussão em torno da ideia de brasilidade, essa ideia sempre esteve pautada por uma relação de ufanismo e exotismo. Com as conquistas da Semana de Arte Moderna de 1922, as tendências do movimento caminham para a constituição de uma arte nacional e nacionalista. As imagens icônicas brasileiras são em geral caracterizadas pela presença de personagens negros e/ou mestiços, fortes e belos, que são favorecidos pela liberdade de uma terra tropical, paradisíaca.


Esses estereótipos continuam uma representação constante em manifestações artísticas que tratam de uma identidade brasileira, principalmente através da literatura, da música e do cinema.  Falar de Gilberto Freyre é tocar em assunto de muita polêmica, pelas paixões, sejam positivas ou negativas, que sua obra de escritor e sociólogo pode levantar. Seu primeiro e mais importante livro, Casa Grande e Senzala – a História da Sociedade Patriarcal no Brasil (1932), foi publicado no mesmo ano em que Adolf Hitler foi nomeado Chanceler do Reich alemão; nesta época, as teorias de eugenia dominavam a Europa e o mundo. Casa Grande e Senzala veio na contramão do pensamento racista em voga na época. Em sua obra, Freyre defendia o futuro do Brasil enquanto nação mestiça, fruto da integração de brancos, negros e índios.


Segundo ele, a riqueza da nossa cultura se devia à colonização portuguesa, constituída por um povo que se adaptava facilmente ao meio e que não tinha preconceito quanto à miscigenação. O livro ainda causa um certo frisson por discutir a educação, os hábitos, os costumes, a alimentação, a religião, a língua portuguesa falada no Brasil e, principalmente, a sexualidade da família patriarcal.


Para Freyre, “todo brasileiro, mesmo o alvo, de cabelo louro, traz na alma, quando não na alma e no corpo [...] sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena ou do negro” (CGS 283). O Brasil seria um laboratório racial, onde poder-se-ia facilmente contrastar a introversão do índio com a extroversão do negro. A população de regiões em que a influência do sangue negro era maior seria mais alegre do que aquela de regiões com maior influência indígena. Como exemplo, Freyre cita a Bahia onde “tem-se a impressão de que todo dia é dia de festa. Festa de igreja brasileira com folha de canela, bolo, foguete, namoro” (CGS 289).


Pela importância enquanto pensador brasileiro, seus trabalhos mais importantes foram traduzidos e publicados em 14 países. Desde Casa Grande e Senzala, Freyre tem sido tema de artigos, livros, palestras, teses e dissertações. Pela sua produção e influência no Brasil e no exterior, é inegável a importância do Gilberto Freyre enquanto produtor de uma imagem do Brasil, de um conceito de brasilidade e de uma identidade brasileira.




segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

O ÓDIO NO BRASIL


            Na década de 1930 foram produzido três grande livros sobre a história do Brasil: Casa Grande e Senzala, Raízes do Brasil e Formação Econômica Brasileira, em 1936 quando foi lançado pelo Sérgio Buarque, Raízes do Brasil, deu margem a um debate dizendo que nós brasileiros éramos homens cordiais e a característica da cordialidade seria a generosidade e a nossa civilidade destacado por todos os visitantes do século XVIII e XIX. Em essência ele diz que somos O Homem Cordial, o que  pode ser interpretado como uma leitura conservadora que nega a violência, sentimentos de ódio que vão do racismo ao preconceito social.



             O pensamento de Sergio Buarque parecia ocultar o fato que nos desenhos de Debret no século XIX, na repressão ao Quilombo dos Palmares no século XVII, na forma em que se mata Zumbi, na própria instituição da escravidão havia uma característica de ódio. Quando houve a repressão a Canudos, a maneira com que se executou todo o Arraial, chegando a se sepultar a memória da cidade com uma represa que vai cobri-la, havia um ódio profundo. Na Guerra do Contestado se usa inclusive avião para reprimir gente brasileira, quando se reprime o cangaço com violência e especialmente ao bando de Lampião com a decapitação, mostra que não são cenas de um país pacífico.



            Na verdade essa discussão de nossa pacificação é fruto de um preconceito construído. Na Cabanagem, Balaiada, revolução de 32 de São Paulo, não é utilizada em nenhum momento a expressão Guerra Civil. Sempre visto como movimentos isolados, mas não Guerra, nos viveríamos apenas agitações. Mas vivemos na verdade, uma situação de violência, matamos o equivalente a um Vietnã só no trânsito, mas temos como característica central que a violência é sempre do outro. No Brasil temos ódios econômicos, sociais e políticos, mas temos um generalizada incapacidade de perceber o ódio em nós, mas uma capacidade profunda de nota-lo no outro.



            Hoje somos capazes de assistir cenas de luta em que homens se esbofeteiam até ficar ensanguentados e ao invés de sermos internados com transtorno violento nos pagamos ingressos para isso no pay per view. É a violência, especialmente a masculina que nos seduz e que nos deleita. Mas entendemos que a violência é sempre no outro, no vizinho, no síndico, na esposa ou no namorado, nos filhos que nos respondem com agressividade, dentro de nós intuímos que somos sempre um poço de equilíbrio e cordialidade. O que mostra que nossas narrativas sobre nós são sempre pacíficas. Dai penso em Hannah Arendt quando dizia que o mal não está inteiramente fora das pessoas, não seria um monstro de olhos verdes como Shakespeare definiu o ciúme, o mal é banal, comum, está disseminado.




            Penso que o que existe no Brasil é uma dualidade cínica entre cordialidade e violência, entendo que um caminho para minimizar esse fosso seria parar de fingir que as pessoas não têm preconceito, que não existe violência, diferença de renda, se vivemos em um sistema classificatório e diferenciador o preconceito nos atinge, reconhece-lo é o primeiro passo para a superação. 

domingo, 26 de janeiro de 2014

O BRASIL DE DEBRET




            Estive pensando e vi que a formação da minha iconografia visual foi como a maioria dos brasileiros, influenciada pelas imagens de Jean Baptiste Debret (1768-1848) ele é conhecido como um dos mais importantes artistas europeus que estiveram aqui no século XIX, na chamada Missão Francesa. Sua produção é composta de farto material visual e textual que realizou sobre o Brasil da época. O interessante é que como ele é conhecido do público não sendo sua produção é utilizada como fonte visual para carros alegóricos de carnaval, capas de discos, aberturas de novelas, estampas variadas de objetos do cotidiano entre outras.


            Viveu quinze anos no Brasil ao chegar em 1816 ele esperava realizar muitas pinturas históricas para d. João do mesmo modo que tinha feito na França para Napoleão, mas o único quadro histórico que a família real encomendou foi o quadro de D. Pedro I. Gosto de sua obra porque no tempo em que esteve aqui se interessou em retratar imagens do cotidiano do Rio de Janeiro o que significava, em grande parte, retratar os escravos que representavam a grande maioria da população da cidade.



            Seus registros mostram as escravas vendedoras, os cariocas no carnaval, os castigos impostos aos escravos, senhores da elite, índios mestiços, tudo que estava ao seu alcance na nascente sociedade brasileira. Embora sua visão seja de estranhamento eurocêntrico com a cultura brasileira sua importância para as artes e a historiografia nacional é notável, seu trabalho retratou o Brasil por meio de sua beleza exótica, sua história natural, e por representações minuciosas da cultura, e dos costumes do povo brasileiro.


            Não posso no entanto, deixar de dizer que sua iconografia foi manipulada para estabelecer relações preconceituosas com os núcleos indígenas e afro brasileiros contribuindo para o fortalecimento do mito das três raças que vê a sociedade brasileira como um todo homogêneo mestiço e coeso. 

sábado, 18 de janeiro de 2014

A COZINHA BRASILEIRA DE ALEX ATALA





Alex Atala é considerado como o melhor chefe brasileiro, seu restaurante em São Paulo ficou em 4º lugar entre os melhores do mundo. Sua fama se deve ao dom que tem de transformar coisas simples em iguarias, ele faz um arroz com feijão dos deuses, mas sabe encantar refinados paladares com sabores tipicamente brasileiros. Me interesso por sua produção, seus livros e críticas sobre seu trabalho porque a comida é uma representação da sua cultura e trabalhar com alimentos brasileiros é a sua grande sacada.


Seu trabalho tem contribuído para a criação de imagem mental internacional sobre os sabores brasileiros. Faz parte de uma geração que viveu a transformação de cozinheiro canônico preso somente ao ambiente da cozinha, pelo cozinheiro celebridade, influenciado por nomes como o espanhol Ferran Adrià. A sua proposta central é produzir pratos que respeitem as sensações adquiridas no paladar doméstico, cotidiana, familiar maternal brasileira no seu restaurante.


Dentre a culinária brasileira regional seu foco central está na cultura da Amazônia, embora recorra também a região do Cerrado e a toda área litoral brasileira. Sua brasilidade pode ser mensurada na busca das raízes por uma cozinha brasileira, pós colonização portuguesa onde encontramos alimentos variados indo da tripa ao quindim.


            Gosto do trabalho de Atala porque ele mostra que no Brasil existem produtos e receitas capazes de executar a gastronomia no sentido mais amplo da palavra, não estando esta restrita apenas a produtos caros e difíceis. Ele mostra que as nossas cozinhas de base são famosas não porque são simpáticas, mas porque são boas e que é possível transforma-las em alta gastronomia.