quinta-feira, 21 de novembro de 2013

OS MELHORES DO JAZZ



            Jazz é um ritmo encantador, daqueles que é impossível ficar triste, ouvindo. Eu acredito que é o melhor da música americana e tem origem nos escravos africanos, começou a ser chamada assim nos anos 1910 e 1920. A distinção e beleza de sua música está relacionada a miscigenação, a suas notas dissonantes são oriundas de notas ornamentais ou armazenamentos. Sua essência é a música vocal e mesmo a execução instrumental quase sempre imitam a voz humana.


            Estudiosos do assunto como Erick Hobsbawm, afirmam que o contexto social do afro norte americano foram fundamentais para a sua produção musical refletindo aspectos culturais de busca em preservar sua música e suas características ancestrais oriundas do contexto africano. Seu surgimento se deu para o entretenimento dos trabalhadores pobres e o crescimento das grandes cidades. É uma música democrática por excelência e apreciada inicialmente pelos menos intelectuais e especialistas.


            Dentre os considerados notáveis escuto dois, Louis Armstrong (1901-1971) e Ella Fitzgerald (1917-1996), que apresentam um mundo maravilhoso de notas, melodias e vozes que são universais.  O que mais gosto em Armstrong, é a capacidade que ele tinha em adiantar ou atrasar notas, mudar a melodia, colocar a voz, fazer efeitos vocais, improvisar ou adiantar uma improvisação. Sua técnica no trompete é notável e ouvi-lo é diversão garantida. Ella é a diva negra de voz doce e incrível, com entonação de menina, técnica vocal apurada com capacidade de percorrer escalas além de cantar com incrível alegria.


            Ouvi-los é para mim uma experiência única, é como se eu fizesse um passeio a esquina acompanhada por eles, ou uma viagem internacional na primeira classe de uma big-band. Quem me leva pela mão nesse passeio, são os instrumentos melódicos (piano, trompete do Armstrong, bateria e baixo) e suas vozes harmoniosas. Como todo bom passeio, vou bem longe e volto segura, um pouco mais feliz, mais viva e sempre querendo mais. 

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

A HISTÓRIA DA SEXUALIDADE BRASILEIRA




Histórias Íntimas da escritora, Mary Del Priori de 2011, foi escrito dentro da linha da micro história e procura compreender a sexualidade brasileira indo além dos números oficiais, espreitando as frestas das portas, adentrando os quartos e traçando um perfil da intimidade dos brasileiros. Para a construção do livro, a historiadora não encontrou muitos documentos oficiais, o seu trabalho foi construído com base em tratados médicos, observações religiosas, pinturas e poesias. O período que o livro abrange vai dos séculos XVI, XVII, XVII período do Brasil Colônia, século XIX, período que a autora considera como o século hipócrita, e século XX, que passa pelos anos 1950, período militar até chegar na nossa contemporaneidade.


No período colonial havia regras e leis que limitavam as práticas relacionadas ao sexo e ao erotismo, a coletividade era mais importante do que o individual, não existia a ideia de sistema privado, tal como o conhecemos hoje, os interesses eram familiares. Sabia-se o que todos faziam, conforme o que mostra os arquivos da Inquisição, a Igreja controlava o comportamento dos casais, que não tinham conteúdo erótico ou sexualizado. Beijos, toques e coitos interrompidos eram proibidos.


A medicina de mãos dadas com a Igreja via a paixão como uma doença que precisava ser interrompida. O amor patológico deveria ser tratado com chás, unguentos e outros tipos de alimentos. O mais interessante desse período colonial é que não era raro se manter relações sexuais no ambiente das sacristias das  Igrejas e confessionários, estas eram rápidas e com as pessoas parcialmente cobertas.


No século XIX os médicos pareciam ter obsessão por sexo, já que falar do assunto era tabu,  e essa prerrogativa era da ciência médica, que lutava contra os chamados “desvios sexuais”: homossexualismo, histerismo, ninfomania, entre outros. As relações sexuais deveriam ser rápidas e cumprir unicamente a função de procriar. A honestidade da mulher era medida pelo seus grau de pudor em relação ao sexo e ao prazer que era controlado pelo esposo.



Mesmo o casamento sendo sagrado, traia-se a olhos vistos, as prostituas, mesmo discriminadas salvavam a família burguesa, com elas, os jovens poderiam se iniciar sexualmente e liberar as pulsões na idade adulta, coisas que não poderiam fazer no leito conjugal. Chocando-se com a rígida moral que procurava se instalar, por meio de uma nascente literatura pornográfica, escondida a sete chaves das mulheres.


No século XX, com a República, inicia-se uma nova vida para o corpo, esse não é mais coberto com véus e longos vestidos, a vida urbana exigia um corpo leve, que frequentava novos espaços de sociabilidade como cinema, estádios, escritórios, a mulher moderna quebrava tabus ao despir as pernas, e para muitos, estava sendo instaurada a devassidão. Mas se valorizava a virgindade, o papel da mulher no casamento, que era a responsável pela manutenção deste e a tolerância a infidelidade do marido continuava.


Nas últimas décadas do século XX foram de liberação quase total. O nu feminino invadiu as telas do cinema brasileiro por meio das pornochanchadas; as modas minimalistas tomarem conta das ruas e praias por meio das minissaias, dos biquínis, dos calções e do topless; a pílula anticoncepcional liberou da mulher o fantasma da gravidez indesejada; o número de divórcios se ampliou; as relações homoafetivas ganharam espaços; a televisão construiu um novo modelo de mulher, liberada, livre das amarras do casamento e que trabalha fora; revistas destinadas ao público feminino passaram a falar abertamente em sexo, orgasmo e fetiches; a literatura pornográfica delimitou seu espaço nas bancas de revistas.


O interessante de Memórias Íntimas é a reflexão que ele suscita após a leitura, o afloramento das marcas que marcam a nossa moralidade, enquanto grupo cultural, somos indivíduos de múltiplas caras: virtuosos e pecadores; permissivos e autoritários; severos com os erros dos outros, mas indulgentes com os nossos; em grupo, politicamente corretos, mas preconceituosos e homofóbicos na intimidade; exigentes dos direitos, mas descumpridores dos deveres, são nossas contradições.


O livro é leitura extremamente prazeirosa e embora o tema não seja inédito nos convida a um voyeurismo históriográfico num museu de sexualidade e erotismo. 

terça-feira, 19 de novembro de 2013

HITCHCOCK ERA SÁDICO?






            Conheci Hitchcock no filme Ladrão de Casaca que já fiz post aqui no blog falando sobre ele. Me intrigava aquela figura enigmática que aparecia nos filmes de forma sutil, porém penetrante. Considero que ele não foi apenas um grande autor de filmes, mas também um personagem fascinante, era preciso ser muito especial, para não sendo ator, essas aparições que falo são relâmpagos, não presidindo uma grande potência, nem sendo herói de guerra se tornar num dos homens mais famosos do mundo.


            No filme lançado pelo britânico Sacha Gervasi, sobre sua vida, foca seu ponto alto no lançamento de Psicose, o filme de 1960, que eu particularmente só vi esse ano, nesses tempos de ócio produtivo, na época do lançamento do filme Hitchcock conhecia prestígio no seu meio de atuação a crítica francesa o considerava além de um mero diretor de cinema, mas um homem criador de um universo misterioso e fascinante, mas ele percebeu que o mundo estava mudando e que naquela época a televisão já alcançava um grande público.


            Em sua vida pessoal, colecionava rejeições femininas Ingrid Bergman o deixara por Rosselini, Grace Kely pelo príncipe de Mônaco, Audrey Hepburn não quis fazer seu filme, talvez por isso, alguns chegaram a defender que o cruel assassino de Marion Crane fosse o revanche de Hitchcock para as mulheres, será? Tenho minhas dúvidas afinal ele tinha um profundo prazer no ato de manejar atrizes, de domina-las de redesenha-las. Fazer Psicose foi uma decisão sozinha, ele enfrentou resistência da Paramout, suas razões nem de longe foram de natureza afetiva ou sexual, ele queria ir além do suspense e dá ao público a sensação de terror.


            Psicose apresentava traços de sadismos, mas o sadismo só alcança o ponto máximo em os Pássaros de 1963. Em Psicose no decorrer do filme cada vez menos terror é empregado e as emoções são direcionadas para a plateia que tem suas emoções regidas com maestria por um bem articulado roteiro. Vejo e revejo seus filmes inúmeras vezes sem me cansar e para mim tem sabor de novidades, somente Hith com seu terror e seu humor era capaz de mostrar as belezas e as feiuras, as grandezas e os horrores de que somos feitos.


segunda-feira, 18 de novembro de 2013

A HISTÓRIA DA LOUCURA DE MICHEL FOCAULT




Minha história com os livros sempre foi uma história de amor, lembro que quando estava na faculdade tinha uma banca com uma vendedora que expunha e vendia livros, aquilo para mim era o melhor lugar da Universidade e perco as contas de quantas vezes me ausentei das aulas para ficar naquele espaço e  conhecer as novidades técnicas e literárias. Numa dessas visitas lembro de uma colega falando que tinha em casa a História da Loucura de Michel Foucault, depois disso, trabalhei com Foucault durante o mestrado e em minha trajetória como professora, conheci vários textos, mas só li História da Loucura esse ano, dez anos após ter terminado a graduação.


Ler a obra é revolucionar nosso olhar sobre a loucura, e as relações entre razão e desrazão como paradigmas do pensamento ocidental. O livro dialoga com as mais diferentes áreas de conhecimento como história, filosofia, psicologia, medicina, psiquiatria, psicanálise, a literatura e as ciências humanas em geral. O interessante é que Michel Foucault é um crítico mordaz do cientificismo puro e do academicismo e nesse ponto, me encontro totalmente afinada com o seu pensamento. Além de ter sido militante político e defender o direito dos loucos, prisioneiros e homossexuais.


A obra nos permite pensar a questão da loucura sob um outro prisma, que abala as estruturas tradicionais do racionalismo moderno, aquele que se encontra sacralizado no pensamento ocidental como sendo a verdade absoluta. Ele revira nossas tradições, nossos modos de existência. Publicado em 1961 como tese de doutorado do autor o seu texto continua atual.


História da Loucura, realiza uma investigação das diferentes formas de percepção da loucura, no período compreendido entre o Renascimento e a Modernidade. Antes do século XVII a loucura tinha uma outra percepção social, após esse período foi introduzida a prática de exclusão como necessidade de ordenação do espaço público. O interessante é que ele mostra que a psiquiatria desde o seu nascimento sempre teve em crise, pelo menos no que está relacionado a cientificidade e a neutralidade.


O grande mérito da obra é nos permitir escapar da definição da loucura como doença mental, percebendo o processo de constituição desta como uma construção através de uma análise histórica sobre a medicalização e psiquiatrização da sociedade. Após História da Loucura é possível e real, a negação para o internamento e isolamento do paciente com doenças mentais. Além de nos fazer refletir  que tratamento damos para o diferente na nossa sociedade?