sábado, 23 de novembro de 2013

KENNEDY, O MITO 50 ANOS DEPOIS



            Ontem fez 50 anos da morte do Presidente Jonh Kennedy dos Estados Unidos da América, imprensa de todo o mundo fala no assunto, e mais do que nunca acredito que os mitos repercutem através dos tempos, como uma ideia hipnótica que se perpetua e se projeta para a posteridade. Kennedy foi o 35º Presidente dos Estados Unidos, com o seu assassinato foi criado um dos mistério mais enigmáticos do século XX, quem realmente matou o presidente?


            Para os americanos e as teorias conspiratórias, tudo foi possível, desde os comunistas russos até Fidel Castro, o que não aceitam por certo é  que Lee Oswald, o assassino apresentado pela polícia e morto dois dias após tenha provocado o fato. Foram mais de mil dias de governo, e a projeção para a história de um jovem político e carismático, herói de guerra, com a família perfeita, defensor da democracia e das liberdades individuais.


            Vendo a sua vida antes do mito, quando era meramente um mortal, penso no poder que o mito tem em glamourizar, pessoas e situações. O mito antes de qualquer coisa é uma instituição, uma forma espontânea de situar os seres humanos na sociedade, suas raízes se acham na explicação simbólica anteriores a consciência. Antes de ser pensado um mito é vivido, adorado, venerado, sustentado pela força misteriosa da fé.


            Acredito que os sonhos e mitos construídos dentro do imaginário coletivo de uma nação, são paradigmas difíceis de serem superados, deve ser por isso, tanto apelo místico em relação a morte de Kennedy e a manutenção do suporte comercial que o tema acarreta, são milhares de livros e filmes produzidos sobre o assunto. Se a verdade fosse realmente conhecida talvez tivesse maiores consequências na política norte americana. Se o presente é consequência do passado, é fundamental saber, com o maior grau de assertividade possível o que é esse passado afinal? Ou a verdade nunca aparecerá e ficará num tempo entre a fronteira do heroismo e do banditismo. 

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

AS CIDADES INVISÍVEIS DE ÍTALO CALVINO





            Esse texto do Ítalo Calvino se tornou inesquecível para mim porque fiz uma citação dele na minha dissertação de mestrado e o meu orientador me pediu para retirar e eu não o fiz. Calvino era minha identidade maior com a temática da cidade como um todo, que eu tratava no trabalho de dissertação. O seu texto é tão impactante que provoca transformações após a leitura, muda-se o olhar que se tem diante das cidades. 


Moro a mais de dez anos na mesma cidade, e durante esse período venho acompanhando seu crescimento e suas mudanças, e mais do que nunca vejo a tese suscitada pelo livro como atual, afinal existem múltiplas cidades dentro de uma só, variando de acordo com os grupos sociais. Quando eu morava no trecho leste a cidade tinha uma cara, cheiros e sabores, mais regionais e aparência menos urbanizada, quando me mudei para o oeste encontrei uma outra cidade, mais próspera, mais urbaniza, mas no entanto, mais quente.


            Essas reflexões trazidas pela obra, nos coloca diante de uma das mais agradáveis produções do século XX, onde o autor lhe dá as diretrizes para que você possa fazer as coisas do seu jeito. É um texto construído de forma a dá passagem a muitos outros espaços, ele mostra que uma cidade espelha-se na outra, gera outra, depende da outra num processo de apagamento de autoria única. Logo que iniciamos a leitura, temos aflorado uma ideia de espanto, não só pelos seus mistérios e segredos, mas pela indeterminação de imagens fugidias que tem as cidades.



            As cidades apresentadas são sempre afirmadas num não lugar, o que impossibilita de serem cartografadas e isso reafirma a potência virtual do texto. O interessante é a capacidade geométrica de articulação de Calvino, que divide a obra em onze blocos, cada bloco apresentando cinco cidades, chegando a um total de cinquenta e cinco. Essas cidades são deslocadas dentro da obra, e a leitura pode começar por qualquer uma, são textos curtos e independentes. O leitor tem ainda a opção de ler apenas o diálogo entre Marco Polo e o Grande Khan, ignorando o relato das cidades. Mesmo avulsas a histórias estabelecem entre si um fio condutor que é o de que não há cidade que não seja sujeita a mudanças.


            O mais curioso é que essas cidades imaginárias sempre têm nome de mulher através de caminhos que se abrem e se bifurcam e nunca se apresentam os mesmos, são elas: Diomira, Isidora, Dorotéia, Zaíra, Izaura, Marília, Zenóbia e tantas outras e escapam do controle humano, racional que oferecem surpresas constantes a todos os sentidos. Suas ruas e vielas nunca podem ser fixadas no papel, sendo comparadas por Marco Pólo aos caminhos das andorinhas que cortam o ar acima dos telhados, perfazem parábolas invisíveis com as asas rígidas, desviam-se para engolir um mosquito, voltam a subir em espiral rente a pináculo, sobranceiam todos os pontos da cidade de cada ponto de suas trilhas aéreas.


            A percepção que Ítalo Calvino desperta através do simbólico e da descrição de Marco Polo, que adentra o império de Kublai Khan traz a ideia de que é preciso superar as aparências e mostrar que as múltiplas cidades são somente uma. Eu particularmente, acredito que As Cidade Invisíveis são construções a partir de nossa memória, que é pilar e edificação de cada cidade. Uma coisa tenho por certo cada cidade só alcança significado, só toma forma a partir daquilo que atribuímos a ela, através de nossas lembranças, vínculos e identificações. 

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

OS MELHORES DO JAZZ



            Jazz é um ritmo encantador, daqueles que é impossível ficar triste, ouvindo. Eu acredito que é o melhor da música americana e tem origem nos escravos africanos, começou a ser chamada assim nos anos 1910 e 1920. A distinção e beleza de sua música está relacionada a miscigenação, a suas notas dissonantes são oriundas de notas ornamentais ou armazenamentos. Sua essência é a música vocal e mesmo a execução instrumental quase sempre imitam a voz humana.


            Estudiosos do assunto como Erick Hobsbawm, afirmam que o contexto social do afro norte americano foram fundamentais para a sua produção musical refletindo aspectos culturais de busca em preservar sua música e suas características ancestrais oriundas do contexto africano. Seu surgimento se deu para o entretenimento dos trabalhadores pobres e o crescimento das grandes cidades. É uma música democrática por excelência e apreciada inicialmente pelos menos intelectuais e especialistas.


            Dentre os considerados notáveis escuto dois, Louis Armstrong (1901-1971) e Ella Fitzgerald (1917-1996), que apresentam um mundo maravilhoso de notas, melodias e vozes que são universais.  O que mais gosto em Armstrong, é a capacidade que ele tinha em adiantar ou atrasar notas, mudar a melodia, colocar a voz, fazer efeitos vocais, improvisar ou adiantar uma improvisação. Sua técnica no trompete é notável e ouvi-lo é diversão garantida. Ella é a diva negra de voz doce e incrível, com entonação de menina, técnica vocal apurada com capacidade de percorrer escalas além de cantar com incrível alegria.


            Ouvi-los é para mim uma experiência única, é como se eu fizesse um passeio a esquina acompanhada por eles, ou uma viagem internacional na primeira classe de uma big-band. Quem me leva pela mão nesse passeio, são os instrumentos melódicos (piano, trompete do Armstrong, bateria e baixo) e suas vozes harmoniosas. Como todo bom passeio, vou bem longe e volto segura, um pouco mais feliz, mais viva e sempre querendo mais. 

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

A HISTÓRIA DA SEXUALIDADE BRASILEIRA




Histórias Íntimas da escritora, Mary Del Priori de 2011, foi escrito dentro da linha da micro história e procura compreender a sexualidade brasileira indo além dos números oficiais, espreitando as frestas das portas, adentrando os quartos e traçando um perfil da intimidade dos brasileiros. Para a construção do livro, a historiadora não encontrou muitos documentos oficiais, o seu trabalho foi construído com base em tratados médicos, observações religiosas, pinturas e poesias. O período que o livro abrange vai dos séculos XVI, XVII, XVII período do Brasil Colônia, século XIX, período que a autora considera como o século hipócrita, e século XX, que passa pelos anos 1950, período militar até chegar na nossa contemporaneidade.


No período colonial havia regras e leis que limitavam as práticas relacionadas ao sexo e ao erotismo, a coletividade era mais importante do que o individual, não existia a ideia de sistema privado, tal como o conhecemos hoje, os interesses eram familiares. Sabia-se o que todos faziam, conforme o que mostra os arquivos da Inquisição, a Igreja controlava o comportamento dos casais, que não tinham conteúdo erótico ou sexualizado. Beijos, toques e coitos interrompidos eram proibidos.


A medicina de mãos dadas com a Igreja via a paixão como uma doença que precisava ser interrompida. O amor patológico deveria ser tratado com chás, unguentos e outros tipos de alimentos. O mais interessante desse período colonial é que não era raro se manter relações sexuais no ambiente das sacristias das  Igrejas e confessionários, estas eram rápidas e com as pessoas parcialmente cobertas.


No século XIX os médicos pareciam ter obsessão por sexo, já que falar do assunto era tabu,  e essa prerrogativa era da ciência médica, que lutava contra os chamados “desvios sexuais”: homossexualismo, histerismo, ninfomania, entre outros. As relações sexuais deveriam ser rápidas e cumprir unicamente a função de procriar. A honestidade da mulher era medida pelo seus grau de pudor em relação ao sexo e ao prazer que era controlado pelo esposo.



Mesmo o casamento sendo sagrado, traia-se a olhos vistos, as prostituas, mesmo discriminadas salvavam a família burguesa, com elas, os jovens poderiam se iniciar sexualmente e liberar as pulsões na idade adulta, coisas que não poderiam fazer no leito conjugal. Chocando-se com a rígida moral que procurava se instalar, por meio de uma nascente literatura pornográfica, escondida a sete chaves das mulheres.


No século XX, com a República, inicia-se uma nova vida para o corpo, esse não é mais coberto com véus e longos vestidos, a vida urbana exigia um corpo leve, que frequentava novos espaços de sociabilidade como cinema, estádios, escritórios, a mulher moderna quebrava tabus ao despir as pernas, e para muitos, estava sendo instaurada a devassidão. Mas se valorizava a virgindade, o papel da mulher no casamento, que era a responsável pela manutenção deste e a tolerância a infidelidade do marido continuava.


Nas últimas décadas do século XX foram de liberação quase total. O nu feminino invadiu as telas do cinema brasileiro por meio das pornochanchadas; as modas minimalistas tomarem conta das ruas e praias por meio das minissaias, dos biquínis, dos calções e do topless; a pílula anticoncepcional liberou da mulher o fantasma da gravidez indesejada; o número de divórcios se ampliou; as relações homoafetivas ganharam espaços; a televisão construiu um novo modelo de mulher, liberada, livre das amarras do casamento e que trabalha fora; revistas destinadas ao público feminino passaram a falar abertamente em sexo, orgasmo e fetiches; a literatura pornográfica delimitou seu espaço nas bancas de revistas.


O interessante de Memórias Íntimas é a reflexão que ele suscita após a leitura, o afloramento das marcas que marcam a nossa moralidade, enquanto grupo cultural, somos indivíduos de múltiplas caras: virtuosos e pecadores; permissivos e autoritários; severos com os erros dos outros, mas indulgentes com os nossos; em grupo, politicamente corretos, mas preconceituosos e homofóbicos na intimidade; exigentes dos direitos, mas descumpridores dos deveres, são nossas contradições.


O livro é leitura extremamente prazeirosa e embora o tema não seja inédito nos convida a um voyeurismo históriográfico num museu de sexualidade e erotismo.