quarta-feira, 20 de novembro de 2013

A HISTÓRIA DA SEXUALIDADE BRASILEIRA




Histórias Íntimas da escritora, Mary Del Priori de 2011, foi escrito dentro da linha da micro história e procura compreender a sexualidade brasileira indo além dos números oficiais, espreitando as frestas das portas, adentrando os quartos e traçando um perfil da intimidade dos brasileiros. Para a construção do livro, a historiadora não encontrou muitos documentos oficiais, o seu trabalho foi construído com base em tratados médicos, observações religiosas, pinturas e poesias. O período que o livro abrange vai dos séculos XVI, XVII, XVII período do Brasil Colônia, século XIX, período que a autora considera como o século hipócrita, e século XX, que passa pelos anos 1950, período militar até chegar na nossa contemporaneidade.


No período colonial havia regras e leis que limitavam as práticas relacionadas ao sexo e ao erotismo, a coletividade era mais importante do que o individual, não existia a ideia de sistema privado, tal como o conhecemos hoje, os interesses eram familiares. Sabia-se o que todos faziam, conforme o que mostra os arquivos da Inquisição, a Igreja controlava o comportamento dos casais, que não tinham conteúdo erótico ou sexualizado. Beijos, toques e coitos interrompidos eram proibidos.


A medicina de mãos dadas com a Igreja via a paixão como uma doença que precisava ser interrompida. O amor patológico deveria ser tratado com chás, unguentos e outros tipos de alimentos. O mais interessante desse período colonial é que não era raro se manter relações sexuais no ambiente das sacristias das  Igrejas e confessionários, estas eram rápidas e com as pessoas parcialmente cobertas.


No século XIX os médicos pareciam ter obsessão por sexo, já que falar do assunto era tabu,  e essa prerrogativa era da ciência médica, que lutava contra os chamados “desvios sexuais”: homossexualismo, histerismo, ninfomania, entre outros. As relações sexuais deveriam ser rápidas e cumprir unicamente a função de procriar. A honestidade da mulher era medida pelo seus grau de pudor em relação ao sexo e ao prazer que era controlado pelo esposo.



Mesmo o casamento sendo sagrado, traia-se a olhos vistos, as prostituas, mesmo discriminadas salvavam a família burguesa, com elas, os jovens poderiam se iniciar sexualmente e liberar as pulsões na idade adulta, coisas que não poderiam fazer no leito conjugal. Chocando-se com a rígida moral que procurava se instalar, por meio de uma nascente literatura pornográfica, escondida a sete chaves das mulheres.


No século XX, com a República, inicia-se uma nova vida para o corpo, esse não é mais coberto com véus e longos vestidos, a vida urbana exigia um corpo leve, que frequentava novos espaços de sociabilidade como cinema, estádios, escritórios, a mulher moderna quebrava tabus ao despir as pernas, e para muitos, estava sendo instaurada a devassidão. Mas se valorizava a virgindade, o papel da mulher no casamento, que era a responsável pela manutenção deste e a tolerância a infidelidade do marido continuava.


Nas últimas décadas do século XX foram de liberação quase total. O nu feminino invadiu as telas do cinema brasileiro por meio das pornochanchadas; as modas minimalistas tomarem conta das ruas e praias por meio das minissaias, dos biquínis, dos calções e do topless; a pílula anticoncepcional liberou da mulher o fantasma da gravidez indesejada; o número de divórcios se ampliou; as relações homoafetivas ganharam espaços; a televisão construiu um novo modelo de mulher, liberada, livre das amarras do casamento e que trabalha fora; revistas destinadas ao público feminino passaram a falar abertamente em sexo, orgasmo e fetiches; a literatura pornográfica delimitou seu espaço nas bancas de revistas.


O interessante de Memórias Íntimas é a reflexão que ele suscita após a leitura, o afloramento das marcas que marcam a nossa moralidade, enquanto grupo cultural, somos indivíduos de múltiplas caras: virtuosos e pecadores; permissivos e autoritários; severos com os erros dos outros, mas indulgentes com os nossos; em grupo, politicamente corretos, mas preconceituosos e homofóbicos na intimidade; exigentes dos direitos, mas descumpridores dos deveres, são nossas contradições.


O livro é leitura extremamente prazeirosa e embora o tema não seja inédito nos convida a um voyeurismo históriográfico num museu de sexualidade e erotismo. 

5 comentários:

  1. Olá Aila,

    ficou muito bom esse "passado à limpo" da sexualidade brasileira. Um resumo bem feito, deixando vontade de ler o livro.

    Abs.

    Paulo

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  2. Aíla, que texto leve, direto e muito bem ilustrado.
    Parabéns, como sempre!!!

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    1. Que bom que gostou, conto sempre com suas intervenções. bj

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  3. A maioria dos historiadores são simplesmente péssimos literatos,o que acaba os levando para a carreira de historiador,com livros medíocres cheios de citações. Mas o livro em questão é excelente,assim como sua leitura do esmo,só não concordo quanto a perspectiva da micro história,o livro praticamente não tem nada da chamada micro história italiana de por exemplo; O queixo e os vermes- Carlo Ginzburg,mas de todo modo gostei da postagem.

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