terça-feira, 15 de abril de 2014

A CAIXA DE PANDORA COM LOUISE BROOKS


            Sempre vi Louise Brooks como o protótipo da mulher dos anos 1920, corte a la garçonne, olhos pretos profundos, vestidos esvoaçantes e certa loucura caraterística daqueles anos pairando no ar. Parece uma moça incontrolável, uma mulher que não esperava por regras estava a frente do seu tempo, vivia de acordo com seus próprios termos. Isso fica claro em A Caixa de Pandora de (1929) um filme alemão feito no fim do cinema mudo.


            O enredo envolve uma mulher de nome Lulu, que afirma não ser prostituta, enquanto vemos que se comporta exatamente como tal. Ela está entretendo o medidor de relógio quando o filme começa então dá boas vindas a um velho e espigado homem, que poderia ser seu pai, seu cafetão ou ambos. Ele quer que Lulu encontre um acrobata, para uma apresentação num trapézio, mas antes ela recebe a visita de seu amante e patrão Shon editor de um jornal.


            Shon está deprimido, está prestes a se casar e quer romper o relacionamento entre eles. Fica ainda mais deprimido quando encontra, o homem velho escondido com uma garrafa atrás de um móvel. Lulu vai encontrar Shon no escritório deste onde é um imã erótico para o filho dele Francis e para uma condessa, que é, com certeza, uma das primeiras manifestações lésbicas do cinema. Lulu vira dançarina numa revista produzida pelo filho do amante. Shon a noiva e o filho vão aos bastidores. Shon se descontrola beija Lulu e é flagrado pela noiva. Ele acaba casando com Lulu.


            O interessante é que todo homem que ama Lulu morre violenta e inesperadamente. A expressão de seu rosto durante um tiro acidental de um personagem é fascinante. Ela parece está fora de sua própria vida, vendo-a passar. O filme é feito de cenas fortes para a época, quando Lulu é vendida por um marquês a um egípcio, ou quando ela morrendo de frio procura se prostituir para ajudar ao cafetão e é assassinada por Jack Estripador.



            Gosto de Brooks porque é moderna, não tem a maquiagem ultrapassada das estrelas do cinema mudo. Como se inclina de um homem a outro a única coisa constante é a sua vontade. Ela não quer dinheiro nem sexo; somente satisfazer e alimentar seu egocentrismo. Poderia ser desagradável mas ela  torna um passatempo fazendo o filme agradável.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

FOUCAULT: SUBJETIVIDADE, VERDADE E PODER

            Foucault sempre foi referência em meus estudos acadêmicos gosto de sua filosofia porque apresenta originalidade à medida que resolveu fazer antes a história do sujeito. Como Nietzsche um dos seus pontos de partida iniciais é a figura de Sócrates. Na filosofia ateniense estariam os fundamentos para o pesquisador encontrar as razões pelas quais se configurou a modernidade.



            A leitura de Foucault em torno de Sócrates se desenvolveu principalmente em lições próximo ao fim de sua vida. No curso no College de France ele diz que o conhece-te a ti mesmo de Sócrates estava em sua época relacionado à um trabalho exclusivamente ético e moral, ao cuidado de si, dentro dos preceitos da construção do eu. Nas regras para a vida correta, na preocupação com a alma, nos modos de prestar atenção a si mesmo e exercer com sabedoria o auto governo.



            Ele acredita que a modernidade desviou essa máxima socrática, desviando o cuidado de si, da filosofia como uma construção de vida voltada para a felicidade e a perfeição. Para os modernos o importante sobre o si mesmo é conhece-lo e o importante da filosofia é conhecer. Para Foucault a Modernidade seria marcada por uma nova forma dos indivíduos com o corpo e com os impulsos. Seu pensamento é tão grande e importante para a nossa contemporaneidade que traça a ideia que vivemos sob um poder que se exerce negativamente, para abafar potencialidades, dando a ideia de que o futuro parece não existir, sendo apenas resto daquilo que ainda não foi esmagado pela repressão dos tempos modernos.   

domingo, 6 de abril de 2014

MICHEL DUCHAMP: O MELHOR DA ARTE CONTEMPORÂNEA


            Na história da arte a palavra gênio se aplica a pouquíssimos criadores. Da Vinci, Picasso, Michelangelo. Dentre esse grupo existe um ainda mais seleto o dos visionários, que figuram Giotto de Bondone (1267-1337) e o francês Michel Duchamp (1887-1968). Giotto é responsável pelas noções de perspectiva e tridimensionalidade que moldaram a escola renascentista e a produção dos séculos seguintes. Por muito tempo artistas hesitaram antes de obedecer aos princípios do mestre italiano ou em desafia-los. Até que surgiu Michel Duchamp.



            A revolução perpetrada pelo francês é mais difícil de ser definida por causa de sua complexidade e da maneira anárquica com que ele mudou tudo na esfera artística. O conceito que orientou seu trabalho, no entanto, é bastante claro. Com Duchamp nasceu a ideia de que uma obra só está completa quando ela se soma a interpretação do outro, no caso o expectador. Ele não se contentava com a arte que se apura simplesmente com a visão, estimulava uma verdadeira troca intelectual com o admirador de suas peças.



            A arte de Duchamp é desprovida de qualquer sentido heroico. Ele não desejava levar arte as massas nem beleza ao cotidiano. Estava interessado em pensar, e em pensar em companhia. Ao tirar um objeto comum do seu contexto usual e elevá-lo a categoria de arte ele anunciava ao mundo que a habilidade manual do artista já não basta para definir uma obra. Instalar uma roda de bicicleta sob um banco era o jeito que tinha de fazer com que o espectador deixasse de vê-la como roda de bicicleta e passasse a admirar os seus contornos. A escolha do objeto deveria partir do artista e isso ganhava valor.



            Em 1913 em seu estúdio em Paris, nasceram os primeiros ready-made da história, exatamente A Roda e o Porta Garrafas. Dois anos depois ele se mudou para Nova York conseguindo sair do anonimato e tendo uma vida pessoal movimentada. A história é ilustrativa do quanto que Duchamp era avançado para a sua época ele integrava a Sociedade dos Artistas Independentes, que tinha como objetivo organizar exposições sem jurados ou premiações. Acredito particularmente que ele foi muito mais radical do que Picasso ou Matisse, pela sua grande capacidade visionária. O simbolismo de suas produções são hoje marcas indeléveis da nossa contemporaneidade.

sábado, 5 de abril de 2014

A MERCADORIA ESCANCARADA


            Sempre me pareceu sem sentido a frase “coca cola é isso aí”. Mas me dou conta que minha instrução não abarca a sabedoria do lucro. Aliás é interessante como a sequência de palavras de ordem dessa mercadoria símbolo acompanha os tempos. Começa com um simples “Beba Coca Cola”, que vai de 1886 a 1892, e continua com uma série de orientações a cerca do valor do produto. Em 1900 é o “tônico cerebral ideal”. Ano após anos segue os apelos baseados nos alegados encantos, refrescante, delicioso, revigorante, até que em 1982 vem a revelação “coca cola é isso aí”.



            Acompanhando a maré vitoriosa da economia de mercado e as previsões do fim da história, o produto se torna bíblico e sua apresentação revela uma pujante pretensão ufanista. É o absoluto a mercadoria não se envergonha mais do seu caráter. Seu fetiche se tornou desnecessário. A etiqueta não habita somente o interior da bolsa o verso da camiseta. Sua natureza se espalhou por toda a superfície visível, a mercadoria é um valor em si.




            De todos os apelos de produtos essa é a frase que fica em minha memória. Sua devastadora força marca a rendição das utopias. Talvez não tenha do que me queixar afinal, a coca cola vai orientando meu caminho, já que a inefável entidade divina e o misterioso cotidiano necessitam de uma figuração. Sabemos escrever nossa história a somente 4 mil anos, então como viver sem bezerros de ouro?

sexta-feira, 4 de abril de 2014

A BELEZA DA LÍNGUA ITALIANA


            A aproximadamente um mês iniciei de forma intensa meus estudos da língua italiana. Estou fascinada por sua suavidade, beleza, harmonia, doçura e romantismo. Fui pesquisar sobre suas origens e vi que a Europa tinha uma mistura de vários dialetos originários do latim, que ao longo dos séculos se transformaram nos idiomas francês, português, espanhol, italiano. Francês, português e espanhol são evoluções das cidades mais importantes de suas regiões (Paris, Lisboa e Madri).



            Na Itália foi diferente, isso porque eles nem se constituíam um país só vieram a se unificar em (1861) e, até então, era uma Península de Cidades Estado em guerra entre si, governada por príncipes locais. O povo era dominado pela França, Espanha e a Igreja Católica. Isso pode explicar o fato que durante séculos se falasse dialetos locais incompreensíveis a outras regiões.



            No século XVI um grupo de intelectuais italianos escolheram o dialeto mais bonito e o batizaram de italiano, para isso, foram até Florença no século XIV, a língua usada pelo grande poeta Dante Alighieri. Em 1321 ao publicar A Divina Comédia numa saga por inferno, purgatório e paraíso,  Dante havia chocado o mundo letrado ao não escrever em latim. Seu idioma era o das ruas como seus contemporâneos: Boccaccio e Petrarca. Ele chamava sua obra de o doce novo estilo do vernáculo.




            O idioma que se fala na Itália e que estou fascinada é basicamente o de Dante, adoro essa história porque acredito que nenhum outro idioma tem um linhagem tão artística e talvez tenha sido forjado para expressar os sentimentos humanos. Adoro seu falar cadenciado, fluídico, parece água transbordante, cada palavra me soa como um buquê de flores. Nada mais belo do que l’amor che move Il sole (o amor que move o sol), beleza e poesia em cada palavra.

terça-feira, 1 de abril de 2014

LA DOLCE VITA, O MELHOR DE FELLINI


            Vi La Dolce Vita de Fellini à uns dez anos, resolvi rever agora para escrever essa resenha aqui para o blog. o filme foi rodado em 1959, na Via Veneto, a rua romana das casas noturnas dos cafés e da badalação. Seu herói Marcello é um colunista de fofocas, que escreve crônicas sobre “a doce vida” de decadentes aristocratas, estrelas de segunda categoria, envelhecidos playboys e mulheres de comércio. O papel foi interpretado por Marcello Mastroianni, para mim seu papel mais representativo de um homem que caia na armadilha de uma vida de noites vazias e madrugadas solitárias.


            O filme transita de uma extravagância visual para outra, acompanhando Marcello enquanto ele caça histórias e mulheres. Ele tem uma noiva suicida em casa. Numa casa noturna, encontra uma promíscua socialite, e juntos visitam o covil de uma prostituta. O episódio não termina em degeneração, mas em sono.


            Outra madrugada. E foi ai que comecei a entender a estrutura do filme: uma sessão de madrugadas de idas e vindas. Marcello se enfia em casas noturnas subterrâneas, em estacionamentos de hospitais, em bordeis e numa antiga catacumba. E sobe no domo da igreja de São Pedro. As cenas de abertura na qual uma estatua de Cristo é transportada por Roma, casam o sagrado e o profano, recheando-as com dúvidas.


            Uma das primeiras sequencias mostra Marcello cobrindo a chegada em Roma de uma saudável mulher que é uma provável estrela de cinema (Anita Ekberg). A perseguição termina de madrugada quando ela entra na Fontana de Trevi, e ele vai atrás, idealizando nela todas as mulheres. A mulher. Ela permanece para sempre fora de alcance.


            O filme foi realizado com uma coragem ilimitada. Fellini parou aqui, no ponto divisor entre o neo realismo dos seus filmes anteriores e o carnaval visual dos seus extravagantes filmes. A trilha sonora é uma ajustada e perfeita composição para o filme. A formação do elenco é cheia de estereótipos, Anita Ekberg talvez não fosse uma grande atriz mas talvez a única capaz de se auto representar.



            Quando vi o filme a primeira vez imaginava que a “doce vida” representava o pecado, o glamour europeu, o enfadonho romance do cínico jornalista. Revendo agora tenho pena de Marcello, das sua noites vazias, da sua solidão. Talvez o que ele chama de “doce vida” não exista, mas é preciso descobrir cada um por conta própria.