segunda-feira, 1 de abril de 2013

LEMBRANÇAS




            Um dia li que não sabemos o tamanho do nosso inconsciente, acrescento a essa máxima uma tentativa de parafrasear Clarice Lispector, quando esta diz que “não sabemos ao certo qual o nosso defeito cortar, pois pode ser que ao cortar qualquer um  todo o nosso edifício venha a cair. Digo isso porque não sabemos ao certo qual lembrança devemos cortar para segurar o nosso edifício inteiro. É certo que o homem é o único animal capaz de expressar emoções através das lembranças, ao que parece as melhores são sempre aquelas que nos remetem a infância e aos momentos de amadurecimento psíquico.


            Essas lembranças da infância ficam armazenadas em nossa memória de longo prazo, e desperta um fenômeno de sensações como algo já conhecido, já vivido que os franceses chamam de déjá vú. Essa capacidade de guardar parte do passado, salvando-o da perda total é o elo capaz de provocar reflexões sobre o que fomos, o que fizemos e qual o projeto que queremos para o nosso futuro.


            Penso que essas lembranças são a garantia de nossa própria identidade, é a representação do nosso EU, é quem realmente somos. A grande capacidade que a memória tem de armazenar acontecimentos, pode também assustar, pois como dizia Santo Agostinho temos medo de esquecer o que de mal vivemos, mas igualmente temos medo de não lembrar a felicidade vivida. Assim vejo que o bom da vida é que somos essa mistura entre presente, passado e futuro e as lembranças são as nossas luzes que se projetam sobre nós mesmos, daí somos hoje o resultado daquilo que fomos nos passado, assim como, do nosso futuro depende integralmente o que fazemos com o nosso presente. 

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

IMPRESSÕES DO CARNAVAL ANTIGO EM VÍDEOS DO YOU TUBE



            Ontem vendo na televisão, o desfile das escolas de samba carioca, vi que vivemos em tempos de alegria, plastificada, onde cada um deseja se mostrar e o ideal é ver e ser visto. Revi uns vídeos do You tube e tirei algumas impressões da festa popular. Primeiro: Qual a origem do carnaval brasileiro? A festa é descendente do entrudo português, uma festa pagã europeia que chegou ao país com os colonizadores, era realizada entre famílias amigas e pessoas conhecidas, só ganhando as ruas mais tarde. O entrudo acontecia num período anterior a quaresma e tinha o significado de liberdade, esse sentido permanece atualmente. A festa chegou a ser proibida e aos poucos foi incorporando elementos como confetes, serpentinas e limões de cheiro, cheios de água perfumada.


            O entrudo foi influenciado por festas carnavalescas da França e da Itália onde se usavam máscaras e fantasias. Personagens como: a colombina, o pierrô e o rei momo foram incorporados ao carnaval brasileiro, embora sejam de origem européia.


            No Brasil no final do século XIX começaram a aparecer os blocos carnavalescos, cordões e os famosos corsos. Em 1890 Chiquinha Gonzaga compôs a primeira marcha especialmente carnavalesca, o Abre Alas, para o bloco rosas de ouro no Rio de Janeiro. O crescimento do carnaval se deve em grande parte, as marchinhas carnavalescas, músicas como Taí na voz da cantora Carmen Miranda, se espalharam pelo país e se incorporaram a iconografia nacional.


            O corso foi a grande sensação do carnaval carioca no Rio de Janeiro no início do século XX, tratava-se de uma tentativa de reproduzir os carnavais mais sofisticados do fim do século XIX na Europa, como as batalhas de flores em Nice no sul da França. No Brasil, eram desfiles de carruagens, depois carros abertos, onde as pessoas se encontravam e lançavam entre si confetes, serpentinas e lança perfume. O corso acontecia na zona sul entre pessoas mais abastadas que possuíam carros, ou tinham dinheiro para alugar.


            Vejo que nos desfiles das escolas de samba as fantasias perdiam em cores para as de hoje, mas ganhava em samba e quem desfilava eram aqueles que moravam perto das escolas. Nos anos 1920 e 1930, de acordo com as imagens, tenho a impressão que o carnaval  tinha um toque de inocência, seja nas crianças nos bailes infantis, as fantasias dos blocos ou a picardia brasileira na letra das famosas marchinhas. E assim se brincava o carnaval, sassarindo e levando a vida num arame.
           

domingo, 10 de fevereiro de 2013

O BRASIL NÃO SUPEROU A CASA GRANDE E SENZALA




            Em uma das férias da faculdade li Casa Grande e Senzala de Gilberto Freyre e minha professora orientadora me estimulou a apresentar um trabalho sobre o cotidiano de senhoras, sinhazinhas e escravas descritas na magistral obra, digo sem nenhuma dúvida que esse primeiro trabalho acadêmico, foi responsável por influenciar minha visão sobre o servilismo à brasileira. Na segunda metade de janeiro desse ano a OIT (Organização Mundial do Trabalho), divulgou uma pesquisa que aponta o Brasil como o país com o maior número de serviçais, (empregados domésticos), pessoas que cuidam de outras e realizam trabalhos que vão de passear com o cachorro, estacionar o carro ou fazer compras em shoppings centers.


            Os números mostram que de cada 6 mulheres que trabalham no país 1 é doméstica, e que a grande maioria é de mulheres entre 25 e 45 anos, pretas ou pardas, além de registros de maus tratos físicos e psicológicos. Isso mostra os resquícios perversos de nossa escravidão, e da cultura construída no Brasil de que trabalho braçal é coisa de preto. Sergio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil, atribui essa tendência da exploração do trabalho braçal do outro, a nossa colonização portuguesa, onde mostra os portugueses como aventureiros, em busca de resultados fáceis, diferentemente dos ingleses que não teriam dificuldades em realizar esse tipo de trabalho.


            Essa cultura de se cercar de serviçais para realizar as tarefas mais comezinhas, só se sustenta pela colossal desigualdade que vive o Brasil, ainda não superada, embora amenizada pelos programas de transferência de renda do Governo Federal. Fico pensando qual o sentido de se ter um cachorro, e pagar alguém para andar com ele, ou mesmo cuidar de coisas pessoais, empurrar o carrinho de supermercado ou cuidar do filho em tempo integral, pois é no Brasil funciona assim, trabalho braçal é coisa a ser realizada por essa imensa casta de serviçais.


            Acredito que os mais ricos do país deve aprender a ver o outros como iguais, e romper a barreira de andar com a babá imaculadamente vestida de branco empurrando o carrinho do bebe e esperando de pé em restaurantes e shoppings centers enquanto os patrões fazem refeição. A ideia é superar esses hábitos da cultura brasileira do exibicionismo mimado e da vulgaridade melindrada e ver que cada um pode cuidar de seus próprios prazeres, caprichos, desejos e deveres. O limite para o trabalho do outro é a dignidade humana. 

domingo, 3 de fevereiro de 2013

O QUE GILDA AINDA TEM A NOS DIZER




            Gilda (1946) é um desses filmes que se sabe quase tudo, mas nunca se vê, lembro que cresci vendo a imagem enigmática na velha Enciclopédia Britânica, daquele mulher de cabelos esvoaçantes num vestido preto de alta costura, uma luva numa mão e na outra um cigarro, com o título “nunca houve uma mulher como ela”. Essa semana, muito tempo depois comprei o filme e vi que o título do passado realmente faz jus a essa máxima e a toda a mitologia que se criou em torno da personagem.


            Antes de qualquer coisa é preciso pensar na Hollywood dos anos 1940, período que o cinema americano, viveu uma época imensamente lucrativa. O filme se passa em Buenos Aires na Argentina, mas nada da cidade é mostrada, o cassino é o cenário principal. A amizade entre os dois homens Johnny Farrell um aventureiro americano que vive na Argentina em busca de fortuna e torna-se o homem de confiança do dono do casino, Mudson, que no filme aparece com um ar meio lunático, é a base do enredo. Mudson aparece casado com Gilda, e logo de início dá para perceber que ela e Farrell já viveram algo no passado, Gilda faz de tudo para destruir a amizade dos dois, e o que achei mais intrigante é como a trama força sempre os dois a permanecerem juntos e essa tentativa forçada é banal e sem sentido.  


            O filme é cheio de estereótipos típicos da sociedade moralista da época, Gilda sai com homens, mas isso não há problema contado com que Mudson, o esposo não saiba. Apanha de Farrell o novo marido, após se pensar que o primeiro tinha morrido, e ainda assim se sugere que ela não traiu ambos. Além da dubiedade embora sutil, da relação entre os dois personagens masculinos. Além da fumaça constante dos cigarros que em várias cenas.


            Mas o forte do filme é mesmo a figura de Rita Hayworth, na época com 28 anos, sua sensualidade é explícita e antes dela no cinema nunca tinha aparecido uma mulher capaz de ser o eixo central do filme e prender as plateias do início ao fim. Fiquei meio sufocada com os cenários fechados e claustrofóbicos do filme, nem uma cena se passa a luz do dia. Mas vale a pena a fotografia de cunho noir, os cenários art decó e sobretudo o número em que Gilda canta e dança Put the Blame a Meme.